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quarta-feira, 24 de abril de 2024

Presídios privados não são melhores do que os públicos

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01/02/2014 08h19

Presídios privados não são melhores do que os públicos, dizem especialistas

Há críticas em relação ao tratamento dos presos, à lógica de administração e ao modelo legal das concessões de prisões.

Há anos enfrentando o problema da falta de vagas em seus presídios, o governo do Maranhão devolveu quase R$ 24 milhões à União. Esta verba era para ser investida em seu sistema prisional.

Segundo a Agência Brasil, entre 1998 e 2012, o estado não conseguiu executar, em tempo hábil, os projetos de construção de um presídio e de duas cadeias públicas.

Juntas, as cadeias de Pinheiro e de Santa Inês e o Presídio Regional de Pinheiro acrescentariam 681 vagas ao sistema carcerário maranhense.

Diante do caos dos presídios e da incapacidade do Estado em investir na área, seja por falta de verbas ou, como no caso do Maranhão, por conta da ineficiência na gestão do gasto público, o Brasil tem apostado em modelos de administração privada dos estabelecimentos.

Embora a expectativa seja de melhorar a situação dos encarcerados, com investimentos em mais vagas sem extrapolar os orçamentários disponíveis, a iniciativa é criticada por muitos especialistas.

O juiz Douglas Martins, por exemplo, avalia que situação das prisões não mudou.

“Nos locais onde localizamos mutirões e há presídios privados não encontramos condições vantajosas como as que são anunciadas normalmente. A situação não é melhor nem pior [do que nos presídios públicos].

Não há nenhum estudo provando que a reincidência ou a reinserção social sejam mais altas ou mais baixas.

O número de pessoas trabalhando [nos privados] é até menor do que no sistema público.

As empresas têm até certa resistência em contratar presos para os serviços internos, como o de cozinha, lavanderia.

O CNJ tem até recomendado que se aumente a quantidade de presos nessas funções”, explica Martins, que é coordenador do Departamento de Monitoramento e Fiscalização do Sistema Carcerário do CNJ (Conselho Nacional de Justiça).

PPPs

Os primeiros presídios privados surgiram no Brasil há cerca de dez anos. Atualmente, empresas dividem a administração com o Poder Público em 22 penitenciárias, localizadas em Santa Catarina, Espírito Santo, Bahia, Minas Gerais, Tocantins, Alagoas e Amazonas.

Em breve, São Paulo e Rio de Janeiro devem ganhar seus primeiros estabelecimentos privados.

As associações com a iniciativa privada ocorrem via terceirização de alguns serviços (como alimentação, cuidados médicos, trabalho e educação) ou transferência total da administração, no qual prevalece o modelo das PPPs (parcerias público-privadas).

Nas PPPs, o governo e uma empresa (ou consórcio de empresas) celebram um contrato de longo prazo, no qual o ente privado fica incumbido das atividades de construção do estabelecimento, administração, vigilância interna, lazer, educação e saúde.

Em troca, o Estado paga uma quantia fixa mensal à empresa, que é, em geral, calculada por preso. No país, a média é de R$ 3 mil por preso.

O primeiro presídio brasileiro construído e administrado na modalidade de PPP é o Complexo Penitenciário de Ribeirão das Neves, localizado na região metropolitana de Belo Horizonte/MG.

Ele funciona desde o início de 2013, sendo gerenciado pelo GPA (Consórcio Gestores Prisionais Associados).

Lucro

Para o coordenador nacional da Pastoral Carcerária, Padre Valdir João Silveira, como as empresas são motivadas pela busca do lucro, a iniciativa privada não é o modelo ideal para administração de presídios. Segundo ele, esta lógica incentiva mais encarceramentos, uma vez que a remuneração é feita por prisioneiro.

“Nos Estados Unidos, houve crescimento de aprisionamento e da violência [nos locais onde existem presídios privados]. Não há nenhum compromisso com a recuperação social da pessoa, apenas com a punição”, pondera.

O coordenador da Pastoral Carcerária ainda destaca a “quarteirização” dos serviços, como a alimentação. “Isso gera ainda mais lucros [para as empresas], e a qualidade da alimentação vai caindo.

Em Ribeirão das Neves, encontramos várias reclamações de presos com relação à alimentação, inclusive gente que fazia greve de fome como forma de protesto”, explica.

Há ainda a questão dos trabalhos realizados dentro dos complexos prisionais. Segundo a Lei de Execução Penal, os empregados que se encontram presos ganham ¾ de um salário mínimo e não recebem benefícios.

Ter funcionários presidiários como funcionário pode ser vantajoso para o empresário, pois podem custar até 54%, menos que um trabalhador em liberdade, dando vantagem competitiva em relação às empresas que não usam esse tipo de mão de obra.

Inconstitucionalidade

Os presídios administrados pelo setor privado também vêm recebendo críticas de especialistas em relação à sua legitimidade jurídica.

Para alguns, há violação do princípio da legalidade, preceito aplicado ao Direito Público, no qual o Estado só pode fazer o que for expressamente previsto em lei. Assim, a inexistência de previsão constitucional para a privatização carcerária a tornaria ilegal.

Além disso, há o direito de punir e executar a pena, elemento indissociável do Estado, segundo o jurista José Cretella. Autor do livro Administração indireta brasileira.

Segundo Cretella, apenas determinados serviços públicos podem ser objeto de concessão e apenas serviços que não necessitem do emprego da força “Não é possível concedê-los [os serviços que exigem uso da força] a particulares, sob pena de falência virtual do Estado, por que se criaria um organismo estatal dentro do próprio Estado”, afirma.

Os governos que adotaram o modelo de administração privada de presídios rebatem as críticas.

A assessoria de comunicação da (SEDS) Secretaria de Estado de Defesa Social de Minas Gerais informou ao Última Instância que o modelo respeita os princípios constitucionais da legalidade e a lei 14.868/2003, que regula o programa de PPPs de Minas Gerais, autorizando a realização de parcerias em atividades relacionadas ao sistema penitenciário.

Ainda alega que o Estado não abriu mão da gestão do sistema. “É responsabilidade do Estado fazer cumprir as penas estabelecidas pela Justiça, cuidar do transporte dos sentenciados, garantir a segurança externa e das muralhas do complexo, fiscalizar e auditar os serviços.”

Condições dos presos

Segundo o Padre Valdir, os presídios administrados por empresas privadas podem até, em alguns casos, prestar melhores serviços do que os públicos, mas o rigor aplicado aos detentos torna suas estadias mais duras e o Complexo de Ribeirão das Neves é um exemplo.

“O presidio tem a estrutura americana – celas pra poucas pessoas, vaso sanitário no meio do ambiente, sem privacidade nenhuma. O chuveiro é fora da cela, no pátio.

São seis pessoas que entram de uma vez, sendo filmadas por uma câmera de segurança. Você não tem privacidade.

O tempo de banho é de três minutos. Mas quem trabalha com o serviço mais pesado, tá cheio de cascão, porque não dá tempo de se lavar direito, não se pode usar shampoo. E tudo isso é uma questão econômica”, critica.

Além disso, o contato com as famílias é mais rígido. Os visitantes ficam separados dos presos por duas grades, dispostas em uma distância considerável.

Para o Padre Valdir, as entidades privadas dão excessiva importância à segurança, uma vez que, se há fugas, elas devem pagar multa ao Estado.

Porém, tais medidas geram frustração nos presos e aumenta o risco de rebeliões. Além disso, não contribuem para reinserção do preso à sociedade.

Mas a assessoria da SEDS também refuta o coordenador da Pastoral Carcerária, afirmando que não há “desvios” na ressocialização.

“A contraprestação dada pelo Estado ao parceiro depende dos resultados obtidos em 380 indicadores, como a inserção de presos em postos de trabalho, a oferta de cursos profissionalizantes, a quantidade e qualidade do atendimento de saúde, entre outros.

A não realização dessas obrigações são indicadores que, juntos, formam o valor que o Estado deverá descontar do pagamento mensal feito ao consórcio”.
(ultimainstancia.uol.com.br)

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