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sexta-feira, 29 de março de 2024

Precisamos fazer do douradense um leitor!, diz Odila

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“Precisamos fazer do douradense um leitor!”, diz Odila

“A influência da família para se fazer leitores é de suma importância.”

19/04/2018 07h38 – Por: Maria Lucia Tolouei

Num país de poucos leitores, avançar com a leitura é um desafio. Para a escritora Odila Schwingel Lange, “isto é quase impossível”. Mas nem por isso, ela desiste de divulgar os livros, na tentativa de incentivar o leitor crítico, atuante e capaz de transformar a realidade à sua volta. “Precisamos fazer do douradense um leitor!”, diz a historiadora.

Odila está investindo no projeto “Geladeiras Literária”, que oferece acesso livre à leitura como ferramenta à melhoria do ensino-aprendizagem. A escritora é categórica: “a educação no Brasil só tem regredido nos últimos anos”.

Segundo a poetisa, as pesquisas são maquiadas pelos órgãos oficiais, que querem mostrar uma realidade equivocada para justificar os grandes gastos com a educação que, na verdade, são mal investidos ou mesmo desviados para outras finalidades. “Os grandes heróis, na verdade, são os/as educadores/as que usam de ferramentas diversas para atingir seus objetivos”.

Odila Schwingel Lange é advogada, professora, mestra em História, membro fundadora da Academia Douradense de Letras e da Academia de Letras do Brasil. Secretária Executiva do Fórum Permanente de Cultura de Dourados. Poetisa a serviço do povo.

Ela, também, tem um programa ao vivo, de música e cultura gaúcha na rádio Javé Web, “Abrindo Cancha”, todo sábado a partir das 14 horas, através do facebook.com/radiojaveweb.

Confira a entrevista que Odila Lange concedeu ontem, no Dia Nacional do Livro Infantil.

Maria Lucia Tolouei: Leitura é fundamental ao ensino-aprendizagem de todas as ciências e artes. Como é possível, num país de poucos leitores, avançar com a educação?

Odila Lange: É quase impossível isto. Na verdade, a educação no Brasil só tem regredido nos últimos anos. As pesquisas são maquiadas pelos órgãos oficiais, que querem mostrar uma realidade equivocada para justificar os grandes gastos com a educação que, na verdade, são mal investidos ou mesmo desviados para outras finalidades. Os grandes heróis, na verdade, são os/as educadores/as que usam de ferramentas diversas para atingir seus objetivos. Para que o estudantado tenha um pouco de acesso à leitura e a grade escolar seja cumprida, enviam o resumo dos livros em PDF para os/as alunos/as lerem. Se não for assim, eles/as não lêem nada e não terão nenhuma noção quando forem enfrentar a grande barreira denominada de vestibular. Existem muitos programas de leitura nas escolas mas ainda não descobrimos a fórmula mágica de despertar o gosto por esta atividade tão indispensável para melhorar o nível de educação de um povo.

O conhecimento que hoje se adquire tão somente via internet, ajuda a formar leitor crítico?

Eu penso que não. A leitura na internet é para quem já possui uma formação, já sabe fazer um julgamento, tirar conclusões. A leitura, para alunos despreparados, sem uma direção, sem um debate, sem a avaliação de alguém torna-se, na verdade inócua. Para se ter um melhor entendimento é preciso discutir a obra lida, avançar nas suas perspectivas de leitor. A Leitura só como lazer e conhecimento é maravilhosa mas nossos alunos ainda não estão preparados para fazer uma leitura crítica e consciente, o que exige maior orientação e experiência.

Por que é difícil criar o hábito da leitura, desde a infância. A relação dos pais, familiares com os livros é determinante, certo?

Com certeza! Existe um ditado italiano que diz: “é de pequenino que se torce o pepino”! A influência da família para se fazer leitores é de suma importância. Uma criança que nunca viu um livro, que não o manuseia, não escuta suas histórias, dificilmente adquirirá o hábito da leitura! É como andar de bicicleta. Eu nunca aprendi a andar, pois, não tive bicicleta na infância e depois de adulta, tentei, mas levei tantos tombos que acabei desistindo de aprender. A reunião em família com leituras, contação de histórias, filmes, música é a melhor maneira de incentivar a criança a gostar de ler. Quando os pais vão ao Shopping fazer compras devem sempre passar por uma livraria, deixar a criança escolher seu próprio livro, manusear, sentir a satisfação de pegar, de tocar, de acariciar. É preciso desenvolver a ideia de que precisamos, não só do alimento para o corpo, mas do alimento para a alma!

O modelo de escola que se tem hoje, incentiva a pesquisa ou direciona apenas a determinados conteúdos?

A escola e os professores, em média, mal conseguem administrar os conteúdos obrigatórios. São poucos abnegados que ainda desenvolvem algum projeto extracurricular. Mas sempre esbarram na história de falta de interesse e de tempo dos alunos e dos próprios professores que, muitas vezes trabalham três períodos para sustentar uma família. Nem mesmo os professores conseguem comprar livros e as bibliotecas das escolas quase sempre estão desatualizadas e não possuem condições de atender a demanda dos educadores.

Como a senhora vê o pouco ou nenhum investimento dos gestores públicos, em relação aos projetos culturais, de incentivo à leitura desde a infância?

Eu vejo de uma forma muito calamitosa. O livro e a leitura ensinam a pensar. Governantes, pelo menos no Brasil, não querem um povo pensante, preferem uma massa de manobra. Entendo que nossa história de formação de um povo começou da pior maneira que pode existir, mas mesmo assim lá se vão mais de 500 anos e acredito que já passou da hora de mudar isso. Infelizmente, nem nossos governantes possuem a formação necessária para dirigir os destinos de um povo, muito menos de um povo culto, pois, a cultura liberta.

Educadores ‘de ponta’ vêm, sistematicamente, inovando nas escolas com, por exemplo, a poetização ou musicalização dos conteúdos. No seu caso, especialista em cordel, vemos que se trata de uma ferramenta altamente útil para isso. Já pensou em sugerir isso ao Estado? Quais os entraves? O que sugere à Educação?

Esta pergunta me faz rir muito. Sugerir a gente sugere a vida inteira, o difícil é ver acatadas nossas sugestões. Tenho diversos projetos de educação através da leitura e composição de Poemas de Cordel mas as escolas pedem que a gente desenvolva isto tudo de graça. Ora, nem relógio trabalha de graça! Nem Cristo viveu de vento, até multiplicou os pães e o vinho para dar de comer aos seus. Como os poetas vão viver de brisa? Parece que somos seres etéreos que não temos as necessidades básicas dos outros mortais como alimentação, transporte, moradia e todo o resto. Recentemente foi aprovado um projeto meu e do Vilella, pelo FIP, onde gravaríamos um CD com poemas musicalizados para contribuir com a educação, principalmente dos deficientes visuais que não estão aptos à leitura a não ser em braille. Muito bem! Este Projeto foi aprovado e posteriormente cancelado pela Prefeita de Dourados. Como se explica isto? A Cultura não interessa aos governantes, pois, um povo culto, pensa, faz reivindicações e isto incomoda o poder público de forma geral.

A senhora tem um projeto, das geladeiras literárias, que são atrativos à leitura. Como anda a implantação?

Tenho o Projeto, desde o mês de janeiro e estou trabalhando arduamente nele, sem receber nada de ninguém. Consiste em colocar geladeiras usadas, que não servem mais para finalidade para a qual foram adquiridas, em lugares estratégicos, com livros à disposição do público para que possa ler, devolver e mesmo trocar. O projeto ainda não está funcionando pois encontrei muitas dificuldades em meu caminho. Várias geladeiras foram doadas pelo povo douradense e muitos livros inclusive. Então o que está faltando? As geladeira
s precisam ser adesivadas explicando o que é o projeto e para que serve, o transporte precisa ser feito. E mais, talvez o fator principal do emperramento: a Prefeitura Municipal de Dourados não mostrou interesse pelo Projeto. Mantive contato e enviei o Projeto para a Secretaria de Serviços Urbanos e para a Secretaria de Cultura ainda em janeiro e até hoje não obtive resposta. Preciso da autorização da Prefeitura para colocar estas geladeiras em Parques, praças e outros lugares públicos para que o povo tenha acesso. Recebi alguns apoios de empresas particulares e clubes de Serviços mas nada da municipalidade, nem resposta. Mas este projeto, por assim dizer, “é a menina de meus olhos”, portanto, não vou desistir.

Qual é a reação das pessoas, em geral, quando abordadas para abraçar a leitura?

Na maioria das vezes, decepcionante. Criei e tentei viabilizar um Projeto de Leitura denominado “Mala de Letras”, para ser desenvolvido no Complexo Esportivo Jorge Antônio Salomão – Jorjão, durante o tempo em que os esportes aquáticos não estavam sendo desenvolvidos, nos meses considerados de inverno. Lá ia eu com aquela mala pesadíssima, lotada de livros e ficava esperando leitores. Ledo engano! Pouquíssimas pessoas olhavam para os livros e quando olhavam faziam cara de pouco caso. Parecia que os livros estavam contaminados com um grande mal! (E estavam mesmo: o ‘mal’ do saber!) Fiquei durante um ano, na administração anterior, tentando oferecer leitura de graça para o povo e como se diz no folclore popular: “dei com os burros n’água”! Doei os livros com mala e tudo e nem o banner que eu fiz às próprias expensas, não consegui de volta. Parece incrível mas é a pura verdade!

Tem projeto novo? Fale sobre futuros investimentos.

Sempre tenho Projetos Novos, o difícil é levá-los a cabo, justamente por falta do vil metal. São poucos os apoiadores e já estou perdendo um pouco de meu ânimo em lidar com cultura.
Penso que poucas pessoas sabem, mas, faço um programa de música e cultura gaúcha na Rádio Javé web, todo sábado a partir das 14 horas. O nome do Programa é “Abrindo Cancha” ao vivo através do facebook.com/radiojaveweb. Todos estão convidados a participar contando causos, recitando poemas, cantando, tocando um instrumento musical, enfim, falando sobre gauchismo.
Temos, um Projeto maravilhoso, em comum com vários artistas e produtores de artes de Dourados que é fazer um grande show de talentos com música, poesia, dança, teatro, circo, artes plásticas e tudo o mais, para mostrar os nossos projetos culturais, cuja verba foi-nos tirada sem nenhuma satisfação. É um Projeto de monta e estamos trabalhando nele coletivamente, mas, já sabemos das dificuldades que virão pela frente. Para fazer cultura para o povo, mesmo de graça, é preciso de alguns valores monetários, pois, figurinos, cenários, sons, iluminação, nada cai do céu. Por aqui a única coisa que cai do céu é chuva, pois, nem neve nós temos.

Odila, conte sobre suas obras, como o “Folclore ou folclore?”. Como adquirir?

Minhas obras estão na Livraria Canto das Letras, Papelaria Universitária e no Sebo Dourados, na Joaquim Teixeira Alves. O livro Folclore ou folclore? está entre estas, mas também vendo pessoalmente, ando com eles no carro e se alguém me encontrar na rua já faço a entrega. O difícil é achar alguém interessado. (risos)

Qual foi a primeira obra, como aconteceu essa carreira literária e onde busca inspiração, você que faz até discurso poético?

A primeira obra publicada foi Folclore ou folclore?, que já está na segunda edição, a segunda publicada com verba do FIC – Fundo de Investimento Cultural do Estado de MS. Acredito que minha inspiração veio de berço, embora muito pobres, ouvi muitas histórias quando era criança. Tropeiros acampavam em nosso galpão, faziam um fogo de chão e ali ficavam, no rigor do inverno, alegrando nossas noites com casos de assombração, “enterros” de dinheiro, revoluções, tropeiradas e tudo o mais. Além disso nós fomos a primeira família da região a ter um rádio, naquela época à bateria. Tinha um programa de histórias infantis à tardinha como se fosse uma novela. Passava um pedacinho por dia e a gente fazia das tripas coração para não perder a história. Meu pai era bravo e quase não tínhamos acesso ao rádio, mas quando ele saía, nós burlávamos a vigilância e corríamos com o serviço no trato dos animais para poder ouvir as tão famosas e inesquecíveis histórias. Foi lá que conheci o “Patinho feio”, a “Galinha Ruiva”, a “Branca de Neve” a “Rapunzel” e tantas outras maravilhas do mundo infantil. Quanto ao discurso poético, já é minha marca registrada, quando falo sem ser em versos, todo mundo me cobra. A inspiração vem do Criador. É um dom que Deus me deu! Nunca fiz curso de oratória, nem de discurso, nem de declamação, nem de nada, neste sentido me considero autodidata.

O que você, mestra em história, diria à esta nova geração?

Eu diria que nunca é tarde para nada. Sempre podemos recomeçar. A vida não vem traçada nem escrita. É um livro em branco que o próprio autor escreve o seu enredo. Muitas vezes as pessoas não descobrem o potencial que possuem e acabam se acomodando. A História nos mostra que nem todas as batalhas foram, vencidas, mas, em todas, haviam soldados que lutavam por uma causa. A História também nos mostra que nem sempre nascemos com a capacidade para tal coisa, mas esta pode ser adquirida. Cícero, o maior orador do mundo, era gago e fazia suas falas à beira mar, com pedrinhas na boca para melhorar a articulação das palavras. Neste sentido há um filme maravilhoso “O discurso do Rei” sobre a vida do Rei George VI, da Inglaterra. Recomendo.

Quem nunca gostou de ler, ainda tem chance? Como desenvolver isso, afinal a leitura é uma boa companheira!

Como eu já disse acima: nunca é tarde para ser feliz! A leitura é um hábito saudável que pode ser desenvolvido em qualquer idade e local, mas sempre é mais fácil começar pela infância. Principalmente para as pessoas que não frequentam mais festas, quase não saem à noite, não fazem um trabalho artesanal, não praticam esporte, a leitura é uma ótima e agradável companhia sim! Hoje, amanhã e sempre! O livro você leva para qualquer lugar. Não precisa de internet, nem de energia, nem de aparelho celular. Nas viagens, nas praças, nos consultórios médicos, em qualquer canto, até no banheiro você pode desfrutar de uma boa leitura. Então, não perca tempo! Pegue um livro e saia por aí desfrutando da magia da leitura!

Considerações finais

Somente gostaria de agradecer pela oportunidade e dizer que em breve as Geladeiras Literárias estarão onde deverão estar, oferecendo o acesso ao livro e à leitura, gratuitamente, para todo o povo douradense. Quem quiser falar comigo sobre livros e leitura, sempre estarei à disposição, pois, acredito piamente que precisamos “Fazer do Douradense um Leitor”!

Mestra em História, escritora Odila Langefoto - A Frota

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