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terça-feira, 23 de abril de 2024

Acervo digital com 13 mil edições registra mais de sete décadas de história

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Tiragens digitalizadas desde 1.920 retratam memória cultural do Estado e são disponibilizadas ao público no Centro de Documentação da UFGD

20/04/2018 07h01 – Por: Valéria Araújo

Mais antigo jornal impresso de Mato Grosso do Sul em circulação, O PROGRESSO ingressa no ano 68 preparado para o futuro. Com acervo digital que disponibiliza mais de 13 mil edições, algumas da década de 20, o matutino preserva a memória histórica do Estado e possibilita de forma gratuita aos leitores uma verdadeira viagem no tempo ao toque de um clique.

Tudo isso é possível graças a uma parceria com a Universidade Federal da Grande Dourados (UFGD) que fez toda digitalização do impresso. O trabalho inclui o período entre 1920 a 1927 quando comandado por José dos Passos Rangel Torres em Ponta Porã, passa pela primeira edição em Dourados em abril de 1951 e vai até 9 de agosto de 2005. De lá para cá, o próprio jornal já vêm realizando a digitalização de seus periódicos em PDF.

Todo o conteúdo digitalizado pela Universidade se torna disponível para pesquisa no Centro de Documentação da UFGD. O leitor já encontra todas as edições até o ano de 2001 na sala de pesquisa. O restante (até agosto de 2005) deve ser disponibilizado nos próximos meses, quando a equipe que atua no projeto terminará a revisão e edição de erros de leitura no scanner.

O responsável pelos trabalhos é o professor Paulo Roberto Cimó Queiróz, doutor em Histórica Econômica pela USP. Segundo ele, o projeto iniciou em 2013 e contou com servidores da Universidade e acadêmicos, principalmente dos cursos de Letras e História.

“Em 2009, a diretora-presidente do jornal, Adiles do Amaral Torres procurou a reitoria para propor a parceria, até como forma de ajudar na preservação histórica desses documentos. A universidade tinha até então um pequeno scanner e iniciou os primeiros trabalhos nele, mas posteriormente o equipamento apresentou falhas e ficou inutilizado. Passamos um tempo com os trabalhos interrompidos, até que em 2013 um novo equipamento foi adquirido pela universidade, um Scanner Planetário (A1) no valor de R$ 270 mil com capacidade para copiar até duas páginas de uma vez e pudemos então reiniciar a digitalização dos periódicos. Enquanto isso, o Jornal O PROGRESSO investiu na aquisição de computadores, televisores para a sala de scanner, todo o sistema da rede interna e em bolsas de estudos para alguns universitários que auxiliaram no projeto”, conta.

Conforme o professor, o acervo do Jornal O PROGRESSO tem grande importância histórica e cultural, não só para os acadêmicos e pesquisadores da UFGD, mas para a população em geral, que agora tem acesso ao material de forma gratuita, rápida, simples e dentro da Universidade. Para ele, com o avanço da tecnologia, o sistema já permite ao leitor encontrar edições antigas por meio das palavras-chaves.
Cimó acrescenta ainda que os principais interessados na consulta do acervo digital são de vários perfis diferentes: pesquisadores acadêmicos, escritores em busca de informações, estudantes, antigos leitores do jornal em busca de matérias específicas que ficaram na memória, advogados e até mesmo pessoas que buscam comprovar que trabalhavam em alguma empresa, para fins previdenciários.

Contribuição histórica

Para o professor Paulo Cimó, Dourados é privilegiada por ter na cidade um veículo como O PROGRESSO que registra o cotidiano do município desde a década de 50. “Sabemos que a linha editorial é predominante para determinar aquilo que vai ser publicado ou não, mas quando se tem um periódico que registra dia a dia os acontecimentos da cidade, é mais fácil manter sua história viva. A imprensa, de forma em geral tem papel importante nessa questão. Prova disso são as inúmeras pesquisas que se baseiam nos jornais”, conta.

As bibliotecárias Ivanir Souza e Flavia Muglia são colaboradoras do projeto de digitalização. Segundo elas, todo o trabalho de scanear página por página, revisar, editar falhas e encadernar os originais é superado quando a universidade consegue ajudar alguém que precisa. “Dias atrás duas senhoras que há anos buscavam uma publicação para fins previdenciários, acessaram o acervo digital de O PROGRESSO e em 10 minutos localizaram a edição que precisavam. Elas ficaram tão gratas que para nós foi motivo de muita alegria em ter ajudado”, conta Ivanir.

As universitárias Karoline Alves e Crislaine Araújo também participam como voluntárias no projeto. Karolina explica as experiências de voltar ao tempo através das páginas de O PROGRESSO, durante a digitalização.

“Eu faço história, então já tenho um olhar diferenciado para documentos históricos. Eles nos servem para estudos, pesquisas, mas para entretenimento também. Eu lembro que, durante o trabalho de digitalização, a gente lia o conteúdo do jornal e se empolgava. No meu caso, o que me chamou a atenção foi a trajetória de Michella Dauzacker Marchi, Miss Brasil 1998. Todos os dias o jornal noticiava os passos dela rumo ao título. Foi muito bom conhecer essa trajetória pelas páginas de O PROGRESSO”, destaca.

A estudante observa ainda que as edições especiais de aniversário de Dourados, do próprio Jornal e O Progressinho, suplemento voltado para o publico infantil também chamaram a atenção durante os trabalhos de digitalização. “Vejo que hoje também se toma um cuidado maior em relação às fotos, principalmente de crimes. O jornal também não tem imagens de mulheres seminuas, que em décadas passadas era comum na imprensa”, destaca.

1ª edição, em 1920, destaca a missão do O PROGRESSO: defender os interesses do povo

Há quase 98 anos, a primeira edição do Jornal O PROGRESSO, em 22 de fevereiro de 1920 em Ponta Porã, trazia no editorial “O nosso apparecimento” a missão do jornal, que é a de defender os interesses coletivos, de forma imparcial e respeitosa com o leitor. Ainda na direção de Militão Viriato Batista e Humberto Coutinho como redator, o número 1, é criado com a expectativa de concentrar suas forças para ajudar no engrandecimento da região.

“Surge armado cavalheiro para lutar pelos interesses deste município, empenhando-se com denodo pelo seu engrandecimento, se a tanto não nos faltar o alento. E surge encorajado, confiando no auxílio deste povo generoso e trabalhador que, numa romagem piedosa e bendita de longe vindo, aqui fez seu lar, cultivando a terra rica de seiva”, diz trecho do editorial.

Outro trecho fala sobre a missão do impresso, até então semanário. “Abordando particularmente os assunptos que dizem respeito a essa porção de Mato Grosso, promettemos fazê-lo com a moderação e com a cortezia que se combinam com a boa educação, banindo as asperezas da linguagem mesmo quando houver responsabilidade da autoria, assim levando em toda a conta o respeito que nos merecem os nossos concidadãos. Desviando de ideais partidários, esse semanário defenderá os interesses do povo prestigiando sempre as autoridades constituídas, levando a sua pequenina, porém collaboração ao governo do Estado”, diz outro trecho.

O número 1 traz a notícia sobre a nova comarca de Porto Murtinho, os 32 novos jurados da Comarca de Ponta Porã, editais de datas de audiência, notas de falecimento de pessoas conhecidas na sociedade, e notícia sobre carnaval na Avenida Internacional, que relatou muita animação, pomba e fantasias luxuosas.

“Às 16 horas de domingo começaram a apparecer na Avenida Internacional os primeiros carros automóveis, galhardamente enfeitados, conduzindo grupos phantasiados, onde se destacavam cavalheiros, senhoras e senhoritas da melhor sociedade brasileira e paraguaya”, diz trecho da notícia.

O nº 29 : Torres assumem

Em 12 de setembro de 1920, a direção do O PROGRESSO passa para as mãos do então advogado José dos Passos Rangel Torres. No editorial intitulado “Nova Direcção”, O PROGRESSO retrata um jornal com a missão de ser imparcial, abrindo as colunas para todos aqueles que quiserem se manifestar sobre assuntos de interesse público e às ordens dos que quiserem manifestar a sua opinião político-partidária.

“De tal modo sem que haja quebra de nossa neutralidade na atitude assumida sem ligação official nem compromissos partidários, suppomos prestar um serviço aquelles que fizerem se utilizar da nossa imprensa local”.

Na responsabilidade de Rangel Torres, o número 29 relatou problemas como a falta de olarias e em conseqüência o preço exorbitante de tijolos que impossibilitavam que as famílias pudessem construir casas dignas para as suas famílias. Na ocasião, as casas estavam desestruturadas, sem condições de conforto para as famílias. As de maneira não tinham um padrão e estavam sendo feitas construções na base do improviso de material.

O PROGRESSO sugeriu que o Conselho Municipal pudesse atrair olarias e que houvesse um plano municipal fornecido para as famílias para que pudessem construir suas casas com modelo de plantas, principalmente nos terrenos doados pelo Conselho Municipal.

O jornal denunciou também a “indiferença” com que foi tratado sobre o desfile de 7 de setembro, “No maior indiferentismo passou este ano a memorável data de 7 de Setembro. Registrando tamanha falta da nossa parte, temos contudo a esperança de que no próximo anno realizaremos festas cívicas comemorativas da grande data, assim dando uma licção de civismo e ao mesmo tempo demonstrando que entre nós não está obliterado o sentimento do nosso patriotismo”, destaca trecho do texto.

O nº 303: A despedida

A edição 303, publicada em 11 de dezembro de 1927, foi a última publicação de O PROGRESSO em Ponta Porã. Na época, o diretor proprietário José dos Passos Rangel Torres, foi nomeado procurador de Justiça, o que o impediu de continuar à frente do matutino.

Na edição de despedida, o periódico trouxe uma reflexão sobre a Justiça brasileira da época. “Nessa questão de condenação dos revolucionários paulistas pelo Supremo Tribunal Federal e que nos faz repetir a sentença, é o seu grão de paixão e de ódio que ella envolve, além do retrocesso da jurisprudência firmada em todas as cortes de Justiça dos países civilizados. Nunca no Brasil se apllicou leis penais de efeitos retroativos. Os ministros que deram visto a causa do bernardismo, fiquem com a primasia”, destaca trecho do texto.

Em outro trecho, o Editorial finaliza com uma mensagem que é adequada até para os tempos atuais. “O Brasil precisa de paz e esta só se fará com a cassação dos ódios e amortecimento das paixões de partidarismo. Que venha a paz completa ao seio da nação brasileira”.

Ano 1 : De pai para filho – O recomeço

O ano era 1951. O PROGRESSO renasce, em 21 de abril, desta ve
z em Dourados e na direção do advogado Weimar Gonçalves Torres. O jornal noticia um momento de grandes expectativas de desenvolvimento do município com a chegada de imigrantes vindos de todos os Estados, após o período de recenseamento. A manchete não poderia ser diferente: “Vertiginosa! A marcha de Dourados para o progresso”.

O número 1 “do recomeço”, noticia uma Dourados pronta para o futuro. “De uma terra inexpressiva e esquecida, passa Dourados a ser uma das regiões mais famosas da pátria. Gente de toda a parte se instala no município para explorar suas magníficas matas, mais de 2.400 pessoas chegadas depois do recenseamento. Grandes vendas de terras, cinema, luz elétrica, linha de aviões diários loteamentos em massa, mais e mais casas de comércio, valorização acelerada dos imóveis, cafezais, produção imensa de algodão e cereais, instalação de grandes serrarias, um instantâneo polifórmico de uma esplêndida realidade”, diz trecho da manchete principal.

O impresso também traz informação do dia a dia douradenses, como a previsão de instalação da primeira emissora de rádio no município e a falta de energia elétrica. O periódico também traz uma reflexão sobre a missão do Jornal O PROGRESSO a partir daquele momento, numa homenagem de Weimar Gonçalves Torres, ao pai, Rangel Torres.

“Há muito tempo atrás, em cidade vizinha nossa, um jornal chamava-se como este, “O PROGRESSO”. A cidade florescente galgava, passo a passo os degraus da civilização. E, aquele jornal pequeno e despretensioso, registrou com serenidade e equilíbrio, testemunhou com fé e heroísmo os fatos mais assinalados de uma forma empolgante em demanda ao futuro e, em pinceladas fortes e vivas retratou a história de lutas inglórios e gloriosas das campanhas revolucionárias dos ideais e angústias de uma gente brava que através de anos e anos legaram a Mato Grosso e a Pátria uma formosa e alvissareira Ponta Porã.

Dirigiu esse jornal a mão firme de um homem que, em si outros predicados não ostentava, possuía os da bondade, da justiça e da perseverança. E o espírito dessas qualidades irradiava claramente em cada número daquele “O PROGRESSO”, como a lua se espelhando numa clara lagoa da campina. Bondoso, ele sabia dar acolhida e voz aos humildes para clamarem contra os opressores. Justo, não lhe faltou jamais a palavra para enaltecer a virtude e verberar o erro. Perseverante, não descansou nunca em meio da jornada.

Esse homem dorme para sempre. Morreu como viveu. Farol que se apagou após sessenta anos de trabalho, extinguiu-se a aclarado ainda com seus derradeiros lampejos os caminhos da bondade e da Justiça perseverante em sua fé e no seu destino até o último raio de luz …

É com a emoção dessas lembranças que hoje, em Dourados, lanço a público este jornal. Se esta terra, como aquela marcha agora em passos largos para um futuro radiante, Deus permita que, neste milagre de revivência, “O PROGRESSO” de Dourados possa cumprir o seu destino como cumpriu O PROGRESSO de Ponta Porã.

E possa eu em sua direção, ser bom, justo e perseverante como foi a figura inesquecível de meu pai”.
Com o lançamento do jornal em Dourados, surge o lema: “Pensamento e ação por uma vida melhor”, num desejo de Weimar Torres de que o jornal fosse um instrumento de luta por dias melhores.

Ano 32 – De pai para filha

Trinta e dois anos se passam e chega 1.983, ano em que se completa 14 anos da morte do fundador de O PROGRESSO, Weimar Gonçalves Torres. A direção do matutino está nas mãos de Vlademiro Muller do Amaral, um dos pioneiros de Dourados, pai de Adiles, sogro de Weimar.

Nesse período de quase uma década e meia, as páginas de O PROGRESSO se mantiveram firmes na missão de dar voz à população e defender os anseios da sociedade. Foi o período de adaptação para que a filha de Vlademiro e viúva de Weimar, Adiles do Amaral Torres assumisse o desafio de dirigir a empresa, tão expressiva, que não era mais só da família Amaral Torres, mas já havia ganhado o coração de todos os douradenses. Com o pai doente, Adiles assume a liderança da administração do jornal e na edição 3.586, publicada em 20 de abril de 1983, ela começa a assinar como diretora juntamente com o pai. Essa data ficou marcada com a denúncias feitas pelo O PROGRESSO em situações como maus tratos aos indígenas da Reserva de Dourados, demissões em massa por parte do poder público e luta dos professores pela Educação.

Cerca de um ano depois, a advogada Adiles do Amaral Torres assume como diretora geral de O PROGRESSO, sem o pai, que havia falecido há alguns meses. A primeira edição assinada exclusivamente pela 1ª mulher à frente do jornal é de 14 de abril de 1.984, ano 33 de O PROGRESSO. A edição 3.822, sob o comando da viúva de Weimar Torres, inovou lançando o caderno “Rural” com entrevista especial com o então secretário de Agricultura e Pecuária do Estado, João Totó Câmara, que revelou estratégias para baratear os custos de produção, uma preocupação dos ruralistas naquela época e nos dias atuais. A primeira edição assinada por Adiles, também abriu mais espaço para as manifestações culturais, garantindo que artigos, poesias entre outras obras tivessem espaço garantido em seu matutino.

Ano 68 – Prontos para o futuro

O ano é 2018 e lá se vão 35 anos de comando de Adiles no mais antigo impresso do Estado em circulação. Hoje, Adiles do Amaral Torres, que recebeu o legado de administrar O PROGRESSO, conta com o apoio das filhas nessa missão: a diretora superintendente Blanche Torres e a diretora executiva June Torres.
Adiles também conta com apoio de netos e familiares para tornar O PROGRESSO um instrumento de luta por dias melhores. Atualmente o jornal passa por uma reestruturação em todos os setores, investe em tecnologia e conteúdo de qualidade.

“O PROGRESSO não pode parar. Essa era a frase que o Weimar mais repetia em relação a empresa. Ele pressentia sua morte jovem e creio que por isso passou a dizer que o jornal teria que continuar, mas com a nossa família, que está cumprindo essa promessa até hoje e se preparando para os próximos 68 anos. É a forma que temos de agradecer o carinho dos nossos leitores que sempre foram fiéis ao nosso trabalho”, destaca Adiles do Amaral Torres.

Digitalização do O PROGRESSO é comandado pelo professor doutor Paulo Cimo, na UFGDfoto - Marcos Ribeiro

O PROGRESSO digitalizado no Centro de Documentação da UFGD - foto: Marcos Ribeiro

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