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sexta-feira, 29 de março de 2024

Criminalização do porte de drogas divide debatedores

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09/09/2014 12h26

Audiência pública revelou discordância sobre a necessidade de endurecer a legislação. Foi o quarto debate sobre o tema promovido pela Comissão de Direitos Humanos.

Uma em cada duas pessoas que respondem a processos por tráfico por terem sido presas em flagrante com maconha portavam até 50 gramas da droga.

Esses acusados são, em sua maioria, jovens sem antecedentes criminais. Em geral, são presos em vias públicas pela polícia militar. Cerca de 80% deles estão desarmados no momento da abordagem.

Desacordo sobre maconha persiste

A constatação foi feita ontem pelo defensor público Daniel Nicory durante audiência pública sobre a regulamentação da maconha. Nicory apresentou estudos sobre o atual quadro carcerário em São Paulo e Salvador e o perfil dos presos no país.

Durante o debate promovido pela Comissão de Direitos Humanos (CDH), o quarto sobre o tema, participantes divergiram sobre a necessidade ou não de endurecer as leis que tratam do porte de drogas.

O objetivo, como nas discussões anteriores, é subsidiar a decisão sobre a transformação ou não em projeto de lei de uma sugestão popular com esse conteúdo (SUG 8/2014).

O texto sugere legalizar “o cultivo caseiro, o registro de clubes de cultivadores, o licenciamento de estabelecimentos de cultivo e de venda de maconha no atacado e no varejo e a regularização do uso medicinal”. As sugestões enviadas pelo Portal e-Cidadania são direcionadas à CDH quando recebem pelo menos 20 mil assinaturas de apoio.

Na opinião de Nicory, a Lei 11.343/2006, que versa sobre criminalização do porte de droga, não abarca toda a complexidade da questão, levando usuários a responder processos por tráfico, considerado crime hediondo, com penas que variam de 5 a 15 anos.

A maior parte dos presos em flagrante no país é presa em via pública. Portanto, reforça a tese de que é o sujeito que é encontrado pelo policiamento de rotina sem muita elaboração, sem oferecer muito risco para a própria polícia.

Esse é que é preso. Estamos superlotando as cadeias com jovens portando quantidade pequeníssimas de drogas, saindo pior do que entraram — apontou.

Ele observou que mesmo com decisões recentes do ­Supremo Tribunal Federal (STF) que deveriam ter ajudado a reduzir o encarceramento, como a que permitiu a ­liberdade provisória para acusados de tráfico, a população de presos por esse crime quase triplicou. O levantamento tem como base dados do Ministério da Justiça.

Assim como Daniel Nicory, o juiz Gerivaldo Alves Neiva, da Associação Juízes para a Democracia e da Comissão de Direitos Humanos da Associação dos Magistrados Brasileiros (AMB), avalia que a Lei 11.343/2006 é pouco clara na definição do que seria uso pessoal. Com isso, disse Neiva, a questão acaba dependendo da decisão dos próprios juízes.

Para o magistrado, a forma repressiva como é encarado o problema das drogas resultou apenas no encarceramento em massa de jovens, pobres, periféricos e excluídos das oportunidades sociais.

Legislação branda

O promotor público do Mato Grosso do Sul Sérgio Fernando Harfouche, que é presidente do Conselho ­Antidrogas do estado, enxerga a questão de forma diferente dos demais debatedores. Para Harfouche, desde a edição da Lei 10.409/2002, houve um arrefecimento na criminalização do usuário.

A legislação atual, na avaliação dele, é ainda mais branda, pois não responsabiliza aqueles flagrados com pequenas quantidades de drogas.

[Antes da Lei 10.409/2002], o usuário era preso e nós tínhamos sim o problema das drogas de forma crônica, mas era um problema contido, pois o usuário estava preso. Isso de certa forma trazia proteção, porque não víamos pessoas esparramadas pelas ruas fumando e usando pelas ruas como vimos hoje nas cracolândias. A 10.409 já pôs na rua 75% do contingente carcerário — apontou.

Os dados foram questionados por Nicory.

Prevenção

De acordo com Harfouche, mesmo com essa “descarcerização”, não houve investimentos na prevenção e tratamento dos usuários de drogas desde então. O promotor também defendeu mudanças que atribuam pena para o usuário flagrado com drogas que não aceite ser internado.

É comum o cara ser preso e dizer que é usuário, dependente químico, como atenuante da pena, mas ele não é tratado […]. Nós sabemos que sem usuário não tem tráfico. O traficante só se importa com aquilo que tem lucro. O uso patrocina o tráfico — argumentou.

No que diz respeito ao uso medicinal da maconha, Harfouche sustentou que o artigo 14 do Decreto 5.912/2006 já determina que o ministro da Saúde tem competência para autorizar o plantio de qualquer substância para uso medicinal. Segundo ele, isso encerra a necessidade de discussão sobre a regulamentação para uso medicinal.

Cristovam Buarque (PDT-DF), que presidiu a reunião, foi incumbido de elaborar relatório sugerindo a admissão ou não da tramitação como projeto de lei da sugestão enviada pelo Portal e-Cidadania. Ele informou que vai priorizar a questão do uso medicinal, mas sem barrar o debate sobre o uso recreativo.

O ideal era termos um mundo livre de todas as drogas, mas, do jeito que está, estamos fracassando. Eu não vou simplificar a questão para ficar bem com a opinião ­pública — assegurou o parlamentar.
(Jornal do Senado)

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