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sábado, 20 de abril de 2024

Pesquisa investe em capim como fonte de energia

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15/01/2015 15h30

O nome do maior animal terrestre da atualidade serve como luva para o capim-elefante. Ele chega a atingir quatro metros de altura apenas seis meses após o plantio.

De origem africana, o capim-elefante foi introduzido no Brasil na década de 1920 e é cultivado em todo o País, principalmente no sistema de capineiras.

Colhido e picado, é oferecido como alimento ao gado, geralmente durante o inverno, quando a seca e o frio deixam os animais sem pastagem. Mas o grande volume de produção tem despertado também o interesse de outro segmento: o de energia.

O capim-elefante pode abastecer caldeiras, gerando vapor que movimenta turbinas e aciona um gerador. É o que está fazendo a Sykué Bioenergya, empresa em São Desidério (BA), colocando energia na rede de transmissão brasileira. Em Goiás, algumas indústrias de cerâmica vermelha fizeram experiências na substituição da lenha pela gramínea nos fornos.

O capim-elefante também pode virar lenha ecológica, por meio de um processo de compactação que o transforma em briquetes ou péletes. Por fim, serve como matéria-prima de etanol celulósico, chamado de 2ª geração (2G).

Como qualquer material vegetal, da celulose nele contida podem ser extraídos açúcares que, fermentados, dão origem ao biocombustível que abastece automóveis e até aviões.

O pano de fundo para o esforço de instituições e empresas no desenvolvimento de tecnologia de cultivo e processamento do capim-elefante para energia é a pressão pela adoção de soluções menos impactantes do ponto de vista ambiental.

A Conferência das Partes (COP-20) realizada no Peru em dezembro de 2014 apontou a necessidade de redução de 40% a 70% nas emissões de gases até 2050 para que não se supere os 2°C de aumento na temperatura média do planeta até o final deste século.

O uso de energia limpa, como a proveniente de biomassa do capim-elefante, está no rol das alternativas buscadas.

Para o pesquisador José Dilcio Rocha, da Embrapa Agroenergia (DF), a inserção do capim-elefante na matriz energética nacional tem papel estratégico.

Primeiramente, ele pode ser uma ferramenta de descentralização da produção, permitindo a geração de eletricidade e a produção de biocombustíveis em locais onde a construção de hidrelétricas ou o cultivo de biomassas tradicionais não é possível.

O Ministério das Minas e Energia prevê a necessidade de aumentar a capacidade instalada de geração de energia no Brasil dos atuais 124,8 GW para 195,9 GW até 2023. “Às vezes, a solução de que você precisa não é nacional, mas regional”, ressalta Rocha.

Bom manejo mantém produção por anos

Várias outras plantas, como a cana-de-açúcar e o eucalipto, já são ou podem ser utilizadas nessas aplicações.

Por que, então, investir no capim-elefante? Alta produtividade é a primeira resposta. O pesquisador Anderson Marafon, da Embrapa Tabuleiros Costeiros (SE), diz que, com dois cortes anuais, extrai-se entre 150 e 200 toneladas de massa fresca por hectare cultivado, o que rende de 40 a 50 toneladas de massa seca.

Os estudos apontam que, se o objetivo é produzir biomassa para energia, o primeiro corte do capim-elefante pode ser feito seis meses depois do plantio – na cana-de-açúcar, esse prazo é três vezes maior e, no eucalipto, chega a sete anos. Além disso, é uma espécie perene.

Se bem manejada, e somente assim, uma área cultivada com a gramínea pode continuar rebrotando por anos a fio. Possibilidade de mecanização da colheita e de manter um fluxo contínuo de matéria-prima ao longo do ano são outras vantagens apontadas.

Na produção de tijolos, telhas e outras cerâmicas vermelhas, algumas empresas começam a experimentar a substituição de lenha por capim-elefante nos fornos.

O Núcleo de Energias Alternativas Renováveis do Governo do Estado de Goiás está apostando na gramínea como biomassa para suprir o segmento, evitando os atravessadores na aquisição de lenha e prevenindo o uso de madeira nativa.

O gerente de desenvolvimento do Núcleo, Victor Salomão de Pina, conta que um projeto para fomento do uso da matéria-prima, especialmente na região de Anápolis, está em desenvolvimento.

“O principal desafio é o domínio da cadeia produtiva e a falta de conhecimento técnico de quem pretende utilizar”, comenta.

O capim-elefante também se prestaria a ampliar a participação e diversificar as fontes renováveis de energia no Brasil.

Cada vez mais acionadas por conta dos prolongados períodos de estiagem, a capacidade de geração em unidades térmicas, hoje, é de pouco mais de 39 milhões de kW, de acordo com dados da Agência Nacional de Energia Elétrica (Aneel).

Desse volume, pouco mais de 30% vem da biomassa. O restante tem como combustíveis produtos de origem fóssil, especialmente óleo diesel e carvão mineral.

Entre as que utilizam biomassa, predominam o bagaço de cana – que abastece principalmente as próprias usinas sucroenergéticas –, e os resíduos da madeira.

O capim-elefante já aparece como combustível de duas empresas: uma no Amapá e outra na Bahia. Esta última é a experiência mais emblemática de uso do capim-elefante para fins energéticos no Brasil.

Com capacidade instalada de 30 mil kW, a Sykué Bioenergya começou a colocar em prática o projeto de transformar essa gramínea em energia elétrica há três anos, com o plantio das primeiras mudas em São Desidério.

A coordenadora de projetos, Giovanna Rajoy, e o CEO da Sykué, Carlos Taparelli, revelam que muitas dificuldades estão sendo encontradas na iniciativa pioneira.

Mudas inadequadas, produtividade abaixo do esperado, alta umidade e necessidade de investimentos maiores que as premissas estão entre os problemas.

Se há alguma intensão de expandir o uso do capim-elefante para geração de energia? A decisão só será tomada após alguns anos de experimento.

Giovanna e Taparelli entendem que conhecer melhor o ciclo de produção e estabelecer rotas tecnológicas para outros usos da gramínea – etanol, por exemplo – estão entre as necessidades.

O vice-presidente de Tecnologia e Desenvolvimento da Dedini Indústrias de Base, em Piracicaba (SP), José Luiz Olivério, reforça que conhecer a biomassa que serve de combustível é o fator mais importante para o bom desempenho de um projeto térmico.

“A riqueza da cana se produz no campo; a usina tem a função de não perder aquilo que o campo fez”, compara.

A empresa do interior de São Paulo foi responsável pelo planejamento e montagem da planta industrial da Sykué.

“Isso nos deixou bastante entusiasmados porque era um desafio inédito; não existia, naquela época, nenhuma outra planta conhecida para produzir energia elétrica a partir do capim-elefante”, conta Olivério.

O mais complexo foi o desenho da estrutura para recebimento, estocagem, processamento e transporte da biomassa até as caldeiras. A partir desse ponto, a planta é bastante parecida com as já usadas para queima do bagaço de cana.

No campo

Desafios identificados em São Desidério são alvo de pesquisas que vêm sendo desenvolvidas em várias Unidades da Embrapa, de forma integrada, com o objetivo de dar ao setor as respostas de que ele necessita.

Atualmente, a gramínea é cultivada em pequenas áreas, utilizando variedades e sistemas de produção que têm como alvo a obtenção de forragem.

A diferença começa na composição do material que se deseja obter. Para alimentar o gado, o desejável é uma biomassa rica em proteína que tenha, portanto, baixa relação carbono / nitrogênio.

Quando o objetivo é aproveitar o material como combustível, o que se busca é justamente o contrário.

“Esse resultado nós temos conseguido só com o manejo, aumentando o intervalo de corte e reduzindo a adubação nitrogenada”, explica o pesquisador Francisco Ledo, da Embrapa Gado de Leite (MG).

Nessa Unidade, está o Banco Ativo de Germoplasma (BAG) de capim-elefante da Empresa, que reúne 120 variedades da forrageira.

A primeira ação da Embrapa visando ao uso do capim-elefante como biomassa para fins energéticos tem sido a avaliação das variedades de que já dispõe para identificar as mais aptas.

O pesquisador Antônio Vander Pereira esclarece que, embora o desenvolvimento de variedades específicas para esta aplicação esteja no horizonte de trabalho, não é preciso esperar anos.

“Os materiais de que dispomos já são altamente produtivos e se prestam à produção de energia”, garante. Em breve, deve ser lançada uma recomendação técnica nesse sentido.

As ações para melhoramento genético também já começaram. Com um projeto inserido no portfólio da Embrapa para o setor sucroenergético, os acessos do BAG estão sendo reavaliados, buscando materiais com características desejáveis para futuros programas de obtenção de cultivares.

“Nossa intenção é gerar subsídios para implantação de um projeto especifico para geração de energia com capim-elefante”, diz o líder do projeto Juarez Campolina Machado.

Há uma rede de instituições de pesquisa participando dos testes, em quatro regiões do País: Sul, Sudeste, Centro-Oeste e Nordeste.

A Embrapa Agroenergia é uma das Unidades que participa desse projeto, caracterizando a biomassa dos acessos pré-selecionados, em parceria com o Laboratório Multiusuário de Química de Produtos Naturais da Embrapa Agroindústria Tropical (CE).

Utilizando ressonância magnética nuclear, está sendo investigada não apenas a composição, mas também a estrutura química dos materiais.

A pesquisadora Patrícia Abrão, da Unidade de Brasília, explica que conhecer os teores de celulose, hemicelulose e lignina não é suficiente para entender por que uma amostra dá melhores resultados do que outra no processo de produção de etanol, por exemplo.

Descobrir quais são os monômeros que compõem cada uma dessas estruturas e as ligações entre eles dá mais subsídios para a equipe de melhoristas trabalhar.

Já há também, na Embrapa, trabalhos em que acessos do BAG estão sendo geneticamente cruzados, buscando materiais com características desejáveis para fins energéticos.

O objetivo é obter novas variedades mais produtivas, tolerantes às pragas e doenças e adaptadas às diferentes regiões brasileiras.

Grandes áreas

Outro desafio é a o desenvolvimento de sistemas de produção em grandes extensões de terra. Para a pesquisadora Letícia Jungmann, da Embrapa Agroenergia, este é um dos principais gargalos, incluindo sistemas de colheita e pós-colheita.

Atualmente, o capim-elefante é cultivado em capineiras que ocupam pequenas áreas. Quando se pensa em produção de etanol ou geração de bioeletricidade, no entanto, há necessidade de muito material.

A Sykué destinou cinco mil hectares para o cultivo da gramínea; em seu site, a Flórida Clean Power anuncia a liberação de 500 mil hectares no Amapá para o mesmo fim.

Pereira, da Embrapa Gado de Leite, lembra que o cultivo em áreas extensivas precisa de manejos adequados para lidar, por exemplo, com problemas fitossanitários.

É também estratégica a obtenção de materiais com ciclos complementares, com colheitas em diferentes épocas, de modo a garantir fluxo de produção de matéria seca o ano todo.

Na Unidade de Execução de Pesquisa e Desenvolvimento de Rio Largo (AL), da Embrapa Tabuleiros Costeiros (SE), pesquisas envolvendo o sistema de produção de capim-elefante têm como objetivo oferecer alternativa de biomassa para a geração de bioeletricidade nas usinas de açúcar e álcool, no período da entressafra.

No território alagoano, 25 usinas processam cana-de-açúcar e se valem da queima do bagaço para gerar energia elétrica.

O pesquisador Anderson Marafon aponta dois gargalos da etapa final do sistema de produção do capim-elefante para energia: a colheita e a redução da umidade.

Dois métodos de secagem ao sol estão sendo testados: com o capim apenas cortado e “deitado” no campo, ou com o material picado e disposto no pátio da usina.

Este último tem conseguido baixar a umidade de 70% para 50% depois do quarto ou quinto dia exposto ao sol.

Quanto à colheita, os testes da Embrapa buscam maquinário eficiente. Nas capineiras, o material é colhido mais jovem e tenro, condição apropriada para alimentação animal. A biomassa para energia, contudo, tem permanecido por cerca de seis meses no campo.

O capim, então, fica mais fibroso e duro e as colheitadeiras normalmente utilizadas não são suficientemente robustas.

Etanol de capim

Ao mesmo tempo em que uma equipe busca soluções para o aprimoramento da produção no campo, nos laboratórios da Embrapa Agroenergia, o capim-elefante é matéria-prima sendo testada na produção do etanol celulósico (2G) desde 2009.

Os experimentos começaram com a participação em um projeto liderado pelo pesquisador Marcelo Ayres, da Embrapa Cerrados (DF), para identificar fontes alternativas de biomassa para a produção sustentável do biocombustível.

Nesse trabalho, o capim-elefante figurava ao lado de outras forrageiras, sorgo, madeira e bagaço de cana, entre as plantas com potencial.

A pesquisadora da Embrapa Agroenergia Silvia Belém afirma que o capim-elefante adaptou-se muito bem ao processo, apresentando características favoráveis. O volume de glicose recuperado foi alto, com o emprego de menor quantidade de enzimas.

Os resultados dessa primeira experiência fizeram com que o centro de pesquisa escolhesse essa gramínea, além do bagaço de cana, como matéria–prima em um grande projeto que estuda formas de otimizar todas as etapas de produção do etanol 2G.
(Embrapa Agroenergia)

Marcos Lopes La Falce - Capim-elefante é matéria prima promissora para produção de energia

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