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quinta-feira, 25 de abril de 2024

“Todos ganharam com divisão do Estado, uns mais que outros”

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Quase 40 anos após a divisão, acho que mais ganhamos que perdemos

Por: Maria Lucia Tolouei – 11/10/2016 07h09

Havia muitas intenções relacionadas à divisão do estado, o então Mato Grosso. De acordo com o doutor em História Econômica, Paulo Roberto Cimó Queiroz, a primeira tinha a ver com a visão geopolítica do governo Geisel, ou seja, a ideia de que o Brasil precisava de uma reorganização territorial, especialmente nos grandes espaços supostamente “vazios” do Oeste e da Amazônia – regiões estratégicas, principalmente por constituírem as fronteiras interiores do país.

“Então, o governo militar julgou que, naquele momento, década de 1970, teria força para implementar pelo menos parte dessa redivisão, ideia antiga, nunca havia saído do papel. (…) A estratégia política do governo Geisel dependia de ele manter o controle da escolha de seu sucessor, escolha essa que precisava ser aprovada por um “colégio eleitoral” formado, principalmente, pelo Congresso Nacional. Nesse contexto, os novos deputados federais e senadores, que representariam MS, seriam de grande ajuda”, conta Cimó.

Confira a entrevista sobre a Divisão do Estado (11 de outubro) concedida a este jornal online, pelo professor doutor da Universidade Federal da Grande Dourados (UFGD), Paulo Roberto Cimó Queiroz, que também é o responsável pelo Centro de Documentação Regional daquela instituição.

Quem, realmente, saiu ganhando com a divisão do Estado?

Olha, acho que ninguém perdeu, exceto, talvez, os contribuintes dos outros estados brasileiros, já que, durante alguns anos após a divisão, o governo federal concedeu recursos financeiros tanto ao Mato Grosso como ao Mato Grosso do Sul. Mas, nos “dois Mato Grosso”, acho que todos ganharam. Talvez uns tenham ganhado mais que os outros.

As elites políticas, por exemplo, certamente ganharam bastante, pois os espaços de poder foram simplesmente duplicados (mais um governador, mais vagas para deputados estaduais, federais, senadores…).
Mas as populações também foram beneficiadas. Os recursos federais resultaram em investimentos que geraram empregos, atraindo inclusive muitas pessoas de fora. No caso de MS, a federalização da antiga Universidade Estadual (UEMT), que se transformou na UFMS, acabou abrindo espaço para a criação da nossa UEMS. Enfim, no caso do Sul, o simples fato de a capital estar mais próxima já foi um avanço, em comparação com a situação anterior.

Qual era a verdadeira intenção e, de fato, se concretizou?

Acho que havia muitas intenções relacionadas à divisão. A primeira tinha a ver com a visão geopolítica do governo Geisel, ou seja, a ideia de que o Brasil precisava de uma reorganização territorial, especialmente nos grandes espaços supostamente “vazios” do Oeste e da Amazônia – regiões estratégicas, principalmente por constituírem as fronteiras interiores do país. Essa ideia de “redivisão territorial” não foi inventada pelo Geisel, é uma ideia muito antiga, vem lá dos escritos de José Bonifácio (o Patriarca da Independência), por volta de 1820; pensava-se em ter um maior equilíbrio, ou seja, as províncias não deveriam ser nem muito grandes nem muito pequenas. Então, o governo militar julgou que, naquele momento (década de 1970), teria força para implementar pelo menos parte dessa redivisão (que, mesmo sendo uma ideia antiga, nunca havia saído do papel…).

O plano do governo Geisel (o II PND, Plano Nacional de Desenvolvimento, lançado em 1974) defendia precisamente um “melhor equilíbrio econômico-político entre as diferentes regiões”, mencionando especificamente o “subcontinente Amazônia-Centro Oeste, com atenção especial à situação de Mato Grosso” (p. 40). Mas é claro que a divisão teve a ver também com circunstâncias mais imediatas. A estratégia política do governo Geisel dependia de ele manter o controle da escolha de seu sucessor, escolha essa que precisava ser aprovada por um “colégio eleitoral” formado, principalmente, pelo Congresso Nacional.

Nesse contexto, os novos deputados federais e senadores, que representariam MS, seriam de grande ajuda. Além disso, acho que não podemos esquecer o histórico de luta pela divisão aqui nesse antigo Sul de Mato Grosso. É claro que, desde o seu ponto mais alto, na década de 1930, essa luta pela divisão veio perdendo força, à medida em que as lideranças sulistas passavam a ter acesso ao centro do poder, em Cuiabá. Mesmo assim, no momento em que o governo federal recolocou a ideia de divisão, ela teve a sustentação de um grupo local, o que certamente contribuiu para que a divisão realmente ocorresse. Nesse sentido, acho possível dizer que os objetivos relacionados à divisão foram, sim, alcançados.

Qual era o cenário do antigo “estadão”, o então Mato Grosso, e como está agora? Quando falaram em divisão, pensaram que o Mato Grosso do Sul poderia superar os números do MT? O que aconteceu?

Na época da divisão havia, de fato, muito otimismo aqui no Sul. Falava-se, por exemplo, que seríamos um “Estado Modelo”. A ideia era a de que nosso único problema era sermos administrados por Cuiabá, ou seja, assim que se “libertasse”, o Sul deslancharia… E, de fato, no momento da divisão, o Sul era maior em tudo, exceto em tamanho: em comparação com o Norte, o Sul tinha mais população, mais produção econômica, mais arrecadação etc.

Depois de alguns anos, como sabemos, essa situação se inverteu completamente, e o atual Mato Grosso supera MS, com folga, em todos esses quesitos. Por que isso? Eu não tenho uma resposta pronta. Imagino que isso tenha a ver com a maior disponibilidade de terras agricultáveis, sobretudo já na porção amazônica de Mato Grosso (e aí é preciso lembrar que toda essa expansão agrícola se fez às custas de uma gigantesca devastação ambiental).

Enquanto isso, aqui em MS, o “estado modelo” degenerou, logo de início, em uma incrível sucessão de golpes palacianos, com governadores entrando e saindo como se houvesse uma porta giratória na entrada do gabinete… A situação política só veio a normalizar-se com as eleições diretas de 1982. Por outro lado, acho importante lembrar que, em termos de indicadores sociais (relativos a saúde, educação etc.), parece que o Sul continua ainda à frente do Norte, o que não deixa de ser um consolo…

Que balanço o senhor faz sobre este quadro e qual a perspectiva futura para o MS?

Acho que eu até já adiantei esse balanço lá na primeira questão. A meu ver, o balanço é positivo, sem dúvida. Quase 40 anos após a divisão, acho que os mato-grossenses, os sul-mato-grossenses e os brasileiros em geral mais ganhamos que perdemos. É claro que nunca vamos saber como seria a situação se não houvesse ocorrido a divisão.

Mas isso não importa; o que importa é avaliar o que se passou e, claro, as perspectivas futuras. Quanto ao futuro, veja, nós somos um estado tão rico, e com uma população tão pequena… À primeira vista, não seria difícil que nos transformássemos, realmente, em um “estado modelo”…

O que falta?

Bom, entre outras coisas, acho que falta um pouco mais de qualidade às nossas lideranças políticas, em todos os níveis. Um de nossos problemas mais graves, a meu ver, é a situação dos nossos povos indígenas. Eles são, hoje, os mais pobres entre os nossos pobres, uma situação que entristece e envergonha a todos os sul-mato-grossenses de boa vontade. E a solução para o problema das terras indígenas não é tão difícil, já está até delineada, está clara para todo mundo; por que, então, não se resolve?

As nossas autoridades estaduais insistem em dizer que toda a responsabilidade é da União, mas é claro que isso não é verdade: quem mais titulou terras em áreas indígenas foi o governo estadual de Mato Grosso (e isso desde o século XIX), e não o federal. Enfim, para não encompridar mais o assunto, acho que as perspectivas futuras de MS podem ser as melhores possíveis, desde que paremos de fugir dos problemas e passemos a enfrentá-los do modo como merecem.

Doutor em História Econômica, Paulo Roberto Cimó Queiroz,

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