Dr. Jajáh*holofote - [Do gr. holóphotos, "totalmente iluminado"]. - Projetor de grande intensidade cuja luz ilumina os...
Dr. Jajáh*holofote - [Do gr. holóphotos, "totalmente iluminado"]. - Projetor de grande intensidade cuja luz ilumina os objetos à distância - Novo Dicionário Aurélio da Língua Portuguesa)
Meus amigos, a mim me fez muito mais mal assistir à notícia das prisões - a forma como foram feitas - de dezessete pessoas acusadas de múltiplos crimes contra a confiança social do que a notícia da ação policial no Rio de Janeiro matando uma criança que estava sendo conduzida por sua mãe em um automóvel juntamente com seu irmãozinho.
Fiquei muito mais revoltado quando vi aquelas pessoas - homens e mulheres - sendo retiradas de suas casas na penumbra da madrugada e conduzidas algemadas sob os holofotes da imprensa, do que quando assisti aquele pai - taxista - chorando e gritando, lamentando a morte de seu querido filho cuja autoria fora de policiais despreparados.
Estranho, meu estimado amigo, como que um cidadão se sinta mais agredido quando vê a notícia da prisão de possíveis criminosos do que quando assiste ao choro de um pai lamentando a morte de seu filho? E o mais estranho é que a minha revolta quando assisti às prisões não era contra os aprisionados. Era contra os aprisionantes. Deixe-me explicar.
Um dia a sociedade, sentindo-se desarmada e despreparada para se defender contra aqueles que, utilizando-se do poder, praticavam crimes - principalmente de corrupção contra os interesses da sociedade, decidiu criar uma instituição dotada de elementos humanos e materiais especiais. Os humanos, científica e tecnicamente preparados e os materiais, tecnologicamente desenvolvidos.
("Corrupção - 1. Ato ou efeito de corromper; decomposição, putrefação. 2. Devassidão, depravação, perversão. 3. Suborno peita" - Novo Dicionário Aurélio da Língua Portuguesa)
Ocorre, meu amigo, que esse instrumento que a sociedade imaginou e criou, que chamarei aqui de "Instituição" tem se comportado, segundo o meu juízo, o juízo de um cidadão comum, passível de correção por "melhor juízo", de maneira indevida e reprovável.
Você acha, meu amigo, que pode um órgão policial, mesmo portando autorização judicial, invadir o silêncio domiciliar de um cidadão, algemar um pai de família na presença de seus filhos, de sua esposa e conduzi-lo como a um animal feroz e agressivo sob as luzes da imprensa, especialmente escolhida, por um camburão para o "detrás das grades"?
Eu sempre soube que a pessoa, protegida pela Constituição Federal do Brasil, só pode ser penalizada depois de condenação transitada em julgado. Isso se deve à presunção de inocência, também garantida pela Lei Maior. Isso quer dizer que todas as pessoas são consideradas inocentes enquanto não for devida e legalmente comprovada a sua culpa.
As penalidades previstas por nossa Carta Magna estão elencadas no artigo 5º, inciso XLVI: "a lei regulará a individualização da pena e adotará, entre outras, as seguintes: a) privação ou restrição da liberdade; b) perda de bens; c) multa; d) prestação social alternativa; e) suspensão ou interdição de direitos.
Será, meu querido amigo, que "entre outras" estão incluídas a execração pública e o pichamento moral, sem julgamento?
Hoje, meu amigo, por mais fortes que sejam os indícios contra aquelas pessoas, não passam de suspeitas. Indícios não têm o poder de condenar, tem, no máximo, o poder de incriminar. Não são capazes de tornar os acusados em culpados, ainda. Isso só será possível depois de submetidos ao devido processo legal, onde será respeitado o amplo direito de defesa, do contraditório, do conhecimento de todos os documentos e alegações que porventura se tenha contra si.
Outra coisa interessante. Este e todos os acontecimentos assemelhados de que eu tenho conhecimento foram deflagrados na madrugada de um feriado ou de um sábado. Por que será?
Eu pergunto, o que vai acontecer com essas pessoas acusadas se não for comprovado a sua culpa?
Para ilustrar o que estou tratando aqui quero lembrar a você de dois acontecimentos domésticos. Ocorreram, em datas diferentes, aqui na nossa cidade, envolvendo instituições diferentes.
O primeiro ocorreu há muitos anos quando eu ainda era recém chegado para Dourados. Havia um restaurante na principal avenida, administrado por uma família de origem oriental. O nome do restaurante era bem sugestivo da origem de seus donos. Era bem freqüentado por famílias, eu gostava de levar minha família, era bem atendido e outros médicos também o faziam. Um dia uma ferramenta pública que cuida da higiene em empresas similares fez, acompanhada dos holofotes da imprensa, uma visita surpresa e expôs possíveis falhas naquele restaurante. O seu proprietário, sentindo-se insuportavelmente agredido em sua honra, não tolerou a agressão e colocou fim, por iniciativa própria, à sua vida.
Outro exemplo, este mais recente. Um cidadão, diretor de certo órgão da administração municipal, foi denunciado de que estava se utilizando de procedimentos ilegítimos no desempenho de suas funções públicas. Foi prezo em sua residência, algemado e a foto dele sendo colocado no camburão, publicada na imprensa. Não resistiu à tão severa penalidade e colocou fim à sua própria vida.
Quem matou essas duas pessoas? As instituições que não desempenharam suas funções com o respeito que o ser humano, mesmo que denunciado ou suspeito, merece. E saber que a nossa Carta Maior garante, em seu artigo 5º, que em nosso país não haverá pena de morte (salvo em caso de guerra declarada).
Originalmente, meu amigo, eu não sou uma pessoa medrosa. Mas se tem uma coisa da qual eu tenho muito medo é de monstro. Monstro, para mim, é uma coisa ameaçadora, horrorosa, que eu não sei onde está e que repentinamente pode me agredir e contra a qual eu não consigo me defender. Ainda mais, meu amigo, quando essa agressão é contra a minha honra, bem tão precioso que cuido com tanto carinho e indormível atenção.
Eu tenho muito mais medo dessa Instituição que faz isso com as pessoas, mesmo que acusadas de atos ilícitos, do que dos policiais da "Cidade Maravilhosa" que, numa operação infeliz, matam pessoas inocentes. Estes são despreparados, daqueles não se pode afirmar o mesmo. E assistir o Ministro da Justiça tentar justificar.*O autor é médico em Dourados - Mato Grosso do Sul - O Estado do Pantanal - PN.
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