05/07/2014 15h27
Pesquisa do Instituto de Física (IF) da USP desenvolveu um modelo computacional e teórico para compreender a evolução temporal, tanto social, quanto econômica, de sociedades.
Os resultados obtidos foram confrontados com os dados já existentes em atlas etnográficos com características de sociedades que existem ou existiram.
O modelo foi aplicado o modelo para entender a importância da rede social no aparecimento do dinheiro, apontando que quanto mais hierárquica for a sociedade, maior a chance de surgir o dinheiro, o que reproduz argumentos utilizados pela antropologia.
O estudo é descrito na dissertação de mestrado de Bruno Del Papa, apresentada no IF com o título Estudo da Evolução Social e Econômica de Sociedades Humanas Através de Métodos de Mecânica Estatística e Teoria de Informação. O trabalho segue a linha de pesquisa iniciada pelo orientador, o professor Nestor Felipe Caticha Alfonso, do IF.
“Nas ciências exatas, em especial na física teórica, quando se tem um problema, o pesquisador o modela teoricamente ou computacionalmente, faz a simulação, os cálculos e, em seguida, compara o resultado obtido aos resultados presentes na natureza”, explica Del Papa, membro do Center for Natural and Artificial Information Processing Systems (CNAIPS) da USP. Esse método, entretanto, não é muito utilizado nas ciências humanas, por isso um dos objetivos do CNAIPS é expandir o modelo para outras áreas do conhecimento.
Longe de querer explicar sociedades detalhadamente, em seu estudo, Del Papa conta que utilizou simulações de Monte Carlo para representar sociedades e suas características por meio de grafos, expondo variáveis que os estudos mostraram ser relevantes: capacidade cognitiva, número de pessoas e algum tipo de pressão ecológica, que pode mudar as configurações sociais.
A princípio interligados, os modelos de evolução social e de evolução econômica são um consequência do outro. Del Papa partiu, então, do modelo de evolução social, proposto pelo seu orientador e outros membros do CNAIPS, refez os passos anteriores e buscou adaptar o sistema ao problema do surgimento do dinheiro em sociedades humanas.
A partir de um modelo teórico, que é um modelo matemático, o pesquisador elabora hipóteses que guiarão o sistema e gerarão resultados.
Quando comparados com os dados dos atlas, os resultados dão indicações de quais variáveis são importantes para o entendimento do problema. Nem sempre óbvias, as relações entre variáveis são buscadas nos atlas, com o auxílio de modelos com motivações antropológicas e de teorias econômicas.
Quando o modelo obtido concorda com os dados recolhidos dos modelos reais, ainda que aquele seja um modelo geral, que identifica pontos principais e variáveis importantes para o sistema, o pesquisador entende que, qualitativamente, a variável considerada é importante para o problema.
Segundo o modelo proposto, o conhecimento acerca das relações entre as demais pessoas é tido como um fator importante para a adaptação de uma pessoa uma sociedade. Em contrapartida, em função da limitação cognitiva, há um “custo” de manutenção dessa informação, gerando uma competição entre as duas variáveis.
O mesmo raciocínio é aplicado ao modelo de evolução econômica, em que um maior conhecimento dos produtos sujeitos a troca é vantajoso ao indivíduo, mas que, por sua vez, gera um “custo” de manutenção de conhecimento.
A aplicação física é colocada no momento em que se associa o função custo à função energia e se propõe a simulação. “A energia é proporcional ao número de relações que você conhece porque a sua memória é limitada, e proporcional ao custo de você não sabê-las”, explica Del Papa.
Diante dos custos, as pessoas concluem o que seria melhor para sua representação mental. É nesse ponto que se infere a possibilidade de uma sociedade ser ou não hierárquica.
Quando as pessoas concordam, ou seja, possuem a mesma representaçao mental, sobre a existência de alguém central, esta é tida como uma sociedade hierárquica.
Quando, porém, não há um indivíduo central e a representação de todos é simétrica, não existe hierarquia. A inserção de variáveis se complexifica quando a condição ambiental está presente. Em ambientes favoráveis, a emergência de sociedades igualitárias ou hierárquicas acontece sem critérios definidos.
Mas em ambientes inóspitos, a depender da quantidade de pessoas, – considerando capacidades cognitivas iguais – as sociedades colapsam em hierárquicas ou igualitárias.
Para falar do surgimento do dinheiro, Del Papa pesquisou teorias econômicas que, classicamente, definem o surgimento do dinheiro como anterior ao do surgimento da desigualdade social.
A disparidade com o modelo utilizado pelo pesquisador surge aí, dado que pelas simulações a desigualdade na rede social facilita a emergência de uma moeda única de troca. Pesquisando além dos clássicos foi possível ao estudante encontrar estudos antropológicos que concordam com os resultados da simulação.
Finalmente, o pesquisador ressalta que, apesar de bastante simplificado, o modelo atingiu o nível de concordar com algumas críticas às teorias econômicas clássicas.
Assim, utilizando o modelo para entender a importância da rede social no aparecimento do dinheiro, quanto mais hierárquica, maior a chance de surgir o dinheiro, reproduzindo, assim, argumentos comumente vindos da antropologia. (Agência USP de Notícias)