13/09/2014 13h43
Entre as grandes economias, o Brasil só registrará um crescimento econômico maior, em 2014, do que a Rússia - que sofre diversos embargos por causa da guerra na Ucrânia -, a França e a Itália, mergulhadas em recessão.
Esses dados fazem parte de relatório da Conferência das Nações Unidas sobre Comércio e Desenvolvimento (Unctad) que prevê alta de 1,3% do Produto Interno Bruto (PIB) do país neste ano.
Entretanto, a entidade já admite que esse número deve ser revisto para baixo. Isso porque o levantamento foi concluído em julho e vários indicadores negativos foram divulgados posteriormente, apontando para uma geração de riquezas que não deve ultrapassar 0,5%.
O economista da Instituto de Economia da Universidade Estadual de Campinas (Unicamp) Antonio Carlos Macedo, encarregado de apresentar os dados, explicou que o estudo projeta um crescimento de apenas 2,7% para a economia global - ainda assim superior ao desempenho brasileiro.
De acordo com o estudo, a baixa expansão é fruto das políticas econômicas austeras adotadas em grande parte dos países para combater a crise global.
Essas políticas, conforme o documento, privilegiam o mercado financeiro, mas não têm produzido benefícios para a atividade produtiva real.
A Unctad defende medidas para aumentar os salários, o que estimularia a demanda interna e tornaria mais justa a distribuição de renda.
Conforme Macedo, a entidade avalia que economias emergentes, como o Brasil, precisam aumentar os investimentos domésticos, tanto públicos quanto privados, e reforçar as políticas industriais para diversificar e ampliar o Produto Interno Bruto (PIB).
"O crescimento mundial é lento e precisa ser reativado também por meio de acordos internacionais que não restrinjam a autonomia das nações para tomar decisões que possam ser contestadas em câmaras como a Organização Mundial do Comércio (OMC)", disse.
Na opinião de analistas, os resultados apresentados pela ONU mostram que o discurso do governo de que o país cresce pouco porque o mundo está em crise não tem base na realidade.
Entre as economias emergentes, o Brasil só avançará mais do que a Rússia. A Índia registrará alta duas vezes maior que a média mundial e a China, quase três vezes.
Por outro lado, algumas das sugestões da Unctad para a retomada do crescimento global e do Brasil contrariam, por exemplo, citações da agência de classificação de risco Moody"s, que reduziu a perspectiva do rating soberano do Brasil.
A decisão levou em consideração a queda, desde 2011, do superavit primário, a economia que o governo precisa fazer para garantir o pagamento da dívida pública.
Segundo a Moody"s, a nota brasileira poderia voltar a ficar estável se o país voltasse a fazer uma economia de 2% a 3% do PIB. A medida, porém, poderia restringir investimentos públicos.
O ex-diretor da área externa do Banco Central Carlos Eduardo de Freitas, é um dos que não levam em consideração o argumento do governo de que a crise internacional contribui para restringir o crescimento do PIB brasileiro.
Segundo ele, as pressões externas tiveram efeito entre 2008 e 2012, mas, desde o ano passado, o país poderia ter apresentado resultados bem melhores.
"Os Estados Unidos se recuperam. Na Europa, há um problema de demanda, mas isso não justifica que o Brasil avance menos de 1%. Nosso potencial de expansão anual de geração de riquezas é de 3%", comentou.
Freitas destacou que, ao contrário do resto do mundo, que precisa estimular a demanda, o Brasil deve adotar política mais austera.
Ele afirmou que a restauração plena do tripé econômico, com câmbio flutuante, controle de gastos públicos e metas claras de inflação, seria um sinal positivo para o mercado. Somente dessa forma os investimentos seriam retomados.
"O governo é intervencionista, não está preocupado com a estabilidade fiscal. Tudo isso afugenta os agentes econômicos e coloca o país na rota de estagnação, com preços elevados. Essa combinação perversa é o pior dos mundos", disse.
Na opinião de Gabriel Leal de Barros, do Instituto Brasileiro de Economia (Ibre) da Fundação Getulio Vargas (FGV), a retomada do crescimento do país passa por alguns reformas.
A primeira seria a simplificação tributária, seguida da reversão de algumas desonerações. Conforme Barros, somente as renúncias fiscais feitas no governo Dilma Rousseff correspondem a 1,7% do PIB e até 0,5 ponto percentual poderiam engrossar as receitas do Executivo.
"Os mecanismos adotados para estimular o consumo, como redução de impostos para a compra de carros e eletrodomésticos estão esgotadas. O brasileiro esta endividado", explicou.
O economista da FGV ainda ressaltou que a baixa qualificação dos trabalhadores é um obstáculo para a retomada do crescimento.
"Não estou defendendo que precisamos ter o maior número de mestres e doutores do mundo. Mas o trabalhador precisa ter o ensino médio completo, um curso técnico ou superior, e dar conta do recado. Na maioria dos casos, as empresas têm problemas", destacou.
O relatório aponta que o resultado da economia global esperado para 2014 é "uma melhoria modesta" em relação ao crescimento de 2,3% verificado em 2012 e 2013.No caso da América Latina e do Caribe, a estimativa da Unctad é de expansão de 1,9% esse ano, abaixo da taxa de 2,6% de 2013.
Neste cenário, o Brasil ajuda a encolher a estimativa para a região. Já a estimativa para os países em desenvolvimento, por sua vez, é de alta de 4,7%, ante 4,6% no ano anterior. (Correio Braziliense)