25/03/2015 09h30
Na 7ª Jornada da Lei Maria da Penha, Conselho Nacional de Justiça prioriza debate sobre formas de promover na prática a segurança que a medida protetiva promete às mulheres que recorrem ao Estado quando estão em situação de violência. A proposta é evitar o homicídio das mulheres que já denunciaram seus agressores.
O Sistema de Justiça ainda enfrenta vários desafios para combater a impunidade e acolher a mulher que é vítima de agressão em casos de violência doméstica.
Entre eles, estão a expansão dos serviços especializados, a capacitação de profissionais sobre a violência de gênero e, principalmente, a garantia de que a segurança prevista nas medidas protetivas de urgência se concretize, segundo recomendações do Conselho Nacional de Justiça (CNJ).
No dia em que a Lei nº 11.340, de 7 de agosto de 2006, completou sete anos de vigência no Brasil, o CNJ reuniu juízes, operadores do Direito, especialistas e gestores públicos em Brasília na 7ª Jornada da Lei Maria da Penha, para efetivar a aplicação da legislação que hoje é conhecida por 98% dos brasileiros, segundo dados de pesquisa recente.
A proposta foi debater os avanços e desafios no horizonte para o enfrentamento à violência doméstica, diante do entendimento de que a implementação da Lei é um processo permanente.
Conselheiro Ney Freitas abre a 7ª Jornada da Lei Maria da Penha, em Brasília “Esta lei é extremamente importante no campo legislativo, mas não é necessária a alteração apenas neste plano, é preciso também uma mudança no plano do comportamento.
Então, esse processo de mudança é demorado, pois ocorre dentro de um processo histórico de alteração de comportamentos na sociedade brasileira”, destacou o conselheiro Ney José de Freitas, presidente da Comissão Permanente de Acesso à Justiça e Cidadania do CNJ, responsável pela realização do evento.
Segundo o conselheiro, o papel do CNJ é promover a reflexão e disseminação de boas práticas no âmbito da aplicação da Lei.
Neste sentido, para o CNJ, neste próximo ano de vigência da Lei a efetividade da medida protetiva deve ser o foco do trabalho entre os operadores do Sistema de Justiça e as forças de Segurança Pública.
Juízes reforçam a importância de garantir a proteção à mulher que recorre ao Estado para interromper o ciclo de violência A medida é considerada essencial entre os mecanismos e regras que buscam coibir essa violência e melhorar o atendimento à mulher vítima de violência doméstica, na avaliação do juiz Álvaro Kalix Ferro, representante do CNJ na Coordenação Nacional da Campanha Compromisso e Atitude pela Lei Maria da Penha e presidente do Fonavid (Fórum Nacional de Juízes de Violência Doméstica e Familiar contra a Mulher).
“As medidas protetivas geram maior confiança à mulher no sentido de que é possível delatar a violência, estando sob o manto e resguardo de uma dessas medidas.
Evidentemente é preciso avançar mais, especialmente no tocante à fiscalização dessas medidas pelo Poder Público, para dar efetiva proteção àquelas que são vítimas de violência”, afirma o juiz.
“A Lei Maria da Penha trouxe muitas inovações, mas a medida protetiva é o que há de mais precioso em termos de garantir a segurança da mulher de forma imediata.
É uma medida judicial especializada, porque nós temos uma vítima e um réu que se conhecem: o réu sabe onde a vítima mora, não é o mesmo caso de uma pessoa que é assaltada na rua.
Então, por conta dessa relação muito próxima entre o réu e a sua vítima, essa medida precisa de um acompanhamento especial”, explica a juíza Luciane Bortoleto, do Juizado Especial de Violência Doméstica e Familiar contra a Mulher de Curitiba/PR e juíza auxiliar do CNJ.
Em sentido semelhante ao ressaltado pelos juízes, a ministra de Estado chefe da Secretaria de Políticas para as Mulheres da Presidência da República (SPM-PR), Eleonora Menicucci, levou para a Jornada uma apresentação das iniciativas do Poder Executivo para coibir a violência doméstica, mas não deixou de fazer um chamado ao Poder Judiciário: “Eu faço um apelo aos senhores e senhoras juízas que expeçam com rapidez máxima e em tempo recorde essas medidas, porque elas salvam as mulheres”, frisou a ministra, lembrando que, segundo levantamento do próprio CNJ, mais de 280 mil mulheres já foram salvas por medidas protetivas nos primeiros cinco anos da lei.
Ainda que as medidas tenham salvado vidas, “as mulheres seguem morrendo com o Boletim de Ocorrência e com a medida protetiva em mãos – ou seja, estão morrendo sob instrumentos que deveriam garantir sua proteção”, conforme frisou a secretária Nacional de Enfrentamento à Violência contra as Mulheres da SPM-PR, Aparecida Gonçalves.
Entre 1980 e 2010, o Brasil registrou os assassinatos de 91.886 mulheres, segundo dados do Mapa da Violência 2012.
Entre estas, estão as milhares de ‘mortes anunciadas’ – ou seja, o assassinato de mulheres que já haviam buscado o Estado para garantir sua proteção e interromper o ciclo de violência.
Por isso, a rapidez em expedir a medida e o empenho em garantir seu acompanhamento são considerados, tanto pelo Poder Judiciário quanto pelo Executivo, elementos essenciais para evitar o homicídio de mulheres.
Para a secretária nacional de Segurança Pública, Regina Miki, o alto número de assassinatos de mulheres reforça a necessidade das medidas protetivas e de mais investimentos em segurança.
“Nosso desafio é transcender esses eventos, como a Jornada, até uma política de Estado. Se nós temos boas práticas é porque isso ainda não se tornou uma política de Estado.
Temos o botão do pânico, a tornozeleira eletrônica, a Patrulha Maria da Penha – exemplos maravilhosos, mas que dependem ainda de pessoas que buscam trazer respostas diferentes no seu dia a dia diante das demandas que lhes são apresentadas”, ponderou.
Pela SPM, Aparecida Gonçalves lembrou que além de trabalhar com programas de efetivação da Lei – como a Campanha Compromisso e Atitude, a Casa da Mulher Brasileira e a expansão do Ligue 180 – é preciso haver campanhas de engajamento da sociedade no enfrentamento à questão.
“Precisamos de mais juizados, centro de referências, delegacias especializadas e profissionais mais envolvidos no processo para que possamos chegar a um resultado. No entanto, precisamos envolver a rede pessoal e social (da vítima), enfim envolver a todos, para assim criar realmente uma rede de proteção à mulher”, afirmou.
Para estimular o debate sobre caminhos que levem à efetividade da medida protetiva, o CNJ socializou algumas experiências positivas com juízes, desembargadores e gestoras do Pacto Nacional de Enfrentamento à Violência Contra as Mulheres, presentes na 7ª Jornada. Confira:
Patrulha Maria da Penha: Serviço da Brigada Militar do Rio Grande do Sul que fiscaliza o cumprimento de medidas protetivas, a Patrulha Maria da Penha envolve outros órgãos do Executivo e o Judiciário e trouxe resultados positivos para coibir a violência contra as mulheres em Porto Alegre e Canoas. Até o fim do ano, governo estadual prepara a expansão da iniciativa para 16 cidades do Rio Grande do Sul.
Botão do pânico: Dispositivo móvel de segurança, distribuído pelo Tribunal de Justiça do Espírito Santo (TJES) às mulheres vítimas de violência doméstica e familiar. Ao apertar o botão, o dispositivo aciona a polícia, que vai ao encontro da mulher.
O equipamento transmite ainda a localização da mulher e inicia um sistema de gravação quando acionado, o que pode constituir prova contra o agressor que desobedeça a medida protetiva em ação penal.
Projeto Justiça Social Além dos Limites Processuais: Iniciativa da Vara Especializada de Imperatriz, Maranhão, proporciona qualificação técnica às vítimas de violência doméstica e familiar, buscando impedir que a dependência econômica do agressor seja um fator preponderante para uma mulher seguir em situação de violência doméstica.
Uma tornozeleira com um alarme aciona os serviços de segurança em Belo Horizonte, Minas Gerais, quando o agressor ultrapassa o limite da distância mínima da vítima estabelecido pela Justiça.
Projeto da Coordenadoria Estadual da Mulher em Situação de Violência Doméstica e Familiar (Cevid) do Tribunal de Justiça do Paraná promoverá uma pesquisa sobre o que ocorre após o deferimento da medida protetiva.
A proposta é realizar visitas às mulheres vítimas de violência, que contaram com medidas expedidas pelo Foro Central da Comarca da Região Metropolitana de Curitiba, e aplicar questionários, buscando avaliar o instrumento. (www.compromissoeatitude.org.br)