A pasta não soube informar, no entanto, quantos municípios dentre os aprovados foram contemplados para financiar especificamente o plano de mobilidade, para investir de forma planejada para melhorar a locomoção nas cidades
Agência Brasil 19/08/2017 10h20
Pouco mais de um mês após a abertura, pelo Ministério das Cidades, de linha de financiamento para elaboração de planos de mobilidade urbana, apenas 87 municípios, dentre os mais de 1,6 mil que pertencem à faixa contemplada, tiveram o cadastro aprovado.
O financiamento do Programa de Infraestrutura de Transporte e da Mobilidade Urbana (Pró-Transporte) foi lançado em 12 de julho, para municípios de até 250 mil habitantes.
A pasta não soube informar, no entanto, quantos municípios dentre os aprovados foram contemplados para financiar especificamente o plano de mobilidade, para investir de forma planejada para melhorar a locomoção nas cidades.
Pelo programa, além dos planos, é possível financiar também sistemas de transporte público coletivo, qualificação viária, transporte não motorizado, estudos e projetos.
A Agência Brasil publica a partir de hoje uma série de matérias especiais Mobilidade urbana, um desafio para as cidades brasileiras.
A baixa eficiência no uso do espaço urbano em transporte, ou seja, a escolha que as pessoas fazem para se deslocar, é um dos principais aspectos que impactam a mobilidade.
Segundo o Instituto de Políticas de Transporte e Desenvolvimento (ITDP), enquanto uma pessoa, ao caminhar, ocupa 0,8m², ela pode chegar a ocupar 60m², se optar por fazer deslocamento similar em um automóvel particular.
A decisão sobre qual transporte usar leva em consideração os fatores segurança, disponibilidade de informação, custo e comodidade, além da disponibilidade e infraestrutura adequada de transporte, segundo o coordenador do Centro Interdisciplinar de Estudos em Transportes da UnB, Pastor Willy Gonzales.
Para ele, todos os elementos que compõem o sistema de mobilidade devem funcionar em conjunto. "Um sistema de mobilidade urbana refere-se à infraestrutura, à parte normativa, aos vários elementos que possibilitam às pessoas deslocar no espaço urbano, dentro deles o transporte público e o transporte privado", afirmou.
O plano de mobilidade foi instituído em 2012, por meio da lei que criou a Política Nacional de Mobilidade Urbana.
Após tramitar por 17 anos, a lei nº 12.587/2012 estipulava o prazo de três anos para que os mais de 1,7 mil municípios com população superior a 20 mil habitantes entregassem seus planos.
Em 2015, apenas 500 prefeituras conseguiram cumprir o primeiro prazo estabelecido, que foi posteriormente alterado pela lei 13.406/2016.
Com a mudança, além do limite de entrega ter sido estendido para abril de 2018, os planos de mobilidade terão de ser compatibilizados com os planos diretores municipais.
Segundo a gerente de projetos do Ministério das Cidades, Martha Martorelli, a mudança impactou diretamente no andamento dos planos de mobilidade: muitos municípios suspenderam a elaboração do plano e atuam sem uma programação.
"Um grande gargalo seriam essas obras e empreendimentos e intervenções sem planejamento, porque na mobilidade urbana isso se esgota rapidamente.
Então, fazer o plano de mobilidade urbana é fundamental. Porque a partir daí, qualquer investimento vai ser mais efetivo para a sociedade", disse.
De acordo com o presidente da Confederação Nacional dos Municípios (CNM), Paulo Ziulkoski, os municípios não conseguirão cumprir o novo prazo para a entrega dos planos. A expectativa é que haja um avanço de cerca de 5% no que já foi entregue.
"Os municípios não têm estrutura de engenheiros de obras para poder elaborar os documentos. Não temos estrutura técnica, nem financeira, para fazer", afirmou.
Para Paulo Ziulkoski, a viabilidade dos planos aumentaria caso os municípios se organizassem em consórcios para a realização de um plano regional.
Ainda assim, ele considera que as cidades teriam dificuldade em executar o planejamento por falta de orçamento, uma das principais barreiras identificadas para elaboração."O Brasil vive uma crise e logicamente que ela atingiu os municípios", afirmou.
Desde a criação da política de mobilidade, os municípios pleiteiam recursos para viabilizar a elaboração dos planos. Uma minoria deles foi financiada por meio de emendas parlamentares.
Segundo o presidente da CNM, os municípios não têm como pegar empréstimos, já que muitos estão endividados atualmente.
Como solução, Ziulkoski propõe o repasse direto do Orçamento Geral da União a fundo perdido. "Não adianta querer apertar o prefeito ou município que não tem como fazer. Primeiro, quem tem que dizer como fazer é a União, que fez a lei.
Se ela tem vontade de terminar com o analfabetismo no Brasil, tem que dizer como é que vai terminar e como é que ela vai ajudar. Não é criar a lei e dizer: 'nós vamos ajudar técnica e financeiramente'", argumenta.
Recentemente, o ministro das Cidades, Bruno Araújo, anunciou o lançamento do programa Avançar Cidades Mobilidade, que prevê R$ 3,7 bilhões para financiamentos de ações no setor.
A gerente de projetos Martha Martorelli explica que os municípios com mais de 100 mil habitantes que ainda não têm o plano de mobilidade urbana e que apresentarem proposta de empreendimento terão que solicitar empréstimo para a elaboração do plano, no qual o projeto deverá ser inserido. "Assim a gente garante que esses recursos que eles vão utilizar sejam mais efetivos e surtam mais efeito".
O Brasil e outros 192 países se comprometeram a tornar as cidades e os assentamentos humanos inclusivos, seguros, resilientes e sustentáveis. Este é um dos 17 Objetivos de Desenvolvimento Sustentável (ODS) das Nações Unidas para 2030.
Para alcançar esses objetivos, foram descritas 169 metas – muitas envolvendo a mobilidade urbana. Mas, assim como em outros lugares no mundo, os municípios brasileiros ainda têm grandes desafios para atingir essas metas.
O professor Gonzales considera que, embora o Brasil já tenha diretrizes estabelecidas pela Política Nacional de Mobilidade Urbana, falta implementá-las, para que as cidades se aproximem das metas. "As ações que permitem implementar as diretrizes é o que está falhando.
Existe uma espécie de vácuo, como se a ponte entre um lugar e outro tivesse caído, ou é fictícia, e não permite que se implemente a lei. Embora existam algumas ações interessantes, mas também muito pontuais", diz.