A política deve ser encaminhada ao Congresso nas próximas semanas
02/11/2017 16h08 - Por Agência Brasil
A três anos do prazo prevista para o Acordo de Paris, fruto da Conferência Mundial do Clima (COP21) sobre a redução das emissões de gases de efeito estufa, substituir o atual Protocolo de Quioto, governos em todo o mundo debatem a necessidade de estabelecer um modelo de governança da política climática que leve à efetivação das metas fixadas para evitar um aquecimento intenso do planeta que supere 2º.
Para tanto, representantes de diversos ministérios, de organizações da sociedade civil e empresas participaram, na terça-feira (31), em Brasília, do workshop Caminhos e Oportunidades para Assegurar uma Efetiva Governança Climática do Brasil.
evento ocorre dias antes da COP23, a conferência do clima das Nações Unidas (ONU), que começa no dia 6 de novembro.
"O objetivo do que deve ser uma nova governança é olhar para que futuro queremos com essa política", resumiu o coordenador de Planejamento e Desenvolvimento Econômico do Ministério do Planejamento, Desenvolvimento e Gestão, Gustavo Fontenele. "É um desafio de país, de sociedade, muito mais que um desafio de governo", destacou.
Hoje, o modelo de governança das políticas de clima do Brasil compreende centralmente o Comitê Interministerial sobre Mudança do Clima; o Grupo Executivo sobre Mudança do Clima; a Comissão Interministerial sobre Mudança Global do Clima e o Fórum Brasileiro de Mudança do Clima.
Os dois primeiros estão inativos e o fórum foi reativado recentemente por meio de decreto governamental. Outras comissões e grupos das várias esferas governamentais compõem essa arquitetura.
De acordo com os participantes do encontro, é preciso rever essa arquitetura, definir uma estrutura de liderança capaz de coordenar as iniciativas e incidir no conjunto das políticas públicas.
O auditor federal de Controle Externo do Tribunal de Contas da União (TCU), Rodrigo Araújo Vieira, destacou que, "quanto mais transversal o problema, maior a responsabilidade de o governo atuar, coordenar e chamar os atores à mesa". Representante do Ministério da Fazenda no seminário, o coordenador-geral de Meio Ambiente e Mudanças Climáticas do órgão reconhece que é preciso "um novo tipo de política, abordagem e engajamento".
Ele explicou que, ao definir as ações que o Brasil adotaria com vistas à meta, cada órgão colocou à mesa aquilo que se dispunha a efetivar. Alguns avançaram e outros não, disse ele, lembrando que a centralidade do problema do aquecimento exige ir além do olhar setorial.
Para dar conta desse desafio, o secretário de Mudanças do Clima e Florestas do Ministério do Meio Ambiente, Everton Lucero, destacou a necessidade de se incorporar às diversas políticas governamentais "a lente climática, seja do ponto de vista de adaptação ou redução de emissões de carbono"; "dar voz aos povos indígenas e povos tradicionais", que muito têm a ensinar "sobre como lidar com os territórios, com a natureza e com a água" e mobilizar a sociedade para que essa agenda seja promovida e defendida.
"Hoje em dia, o que se tenta discutir é que, sem o envolvimento claro e efetivo de todo os atores da sociedade, não conseguiremos implementar as ações de que precisamos", disse o coordenador do Programa de Mudanças Climáticas da WWF-Brasil, André Nahur.
Embora a transformação do clima atenda a uma dinâmica fortemente global, ele defende a necessidade de articulações internacionais e supranacionais.
No caso do Brasil, Nahur disse que é possível implementar cenários de descarbonização envolvendo todos os setores, inclusive a iniciativa privada.
O tema da governança climática está alinhado com o principal desafio da COP23, que é avançar na elaboração do livro de regras para implementação do Acordo de Paris, que, segundo as Nações Unidas, está em risco.
Hoje, a organização lançou a oitava edição do Relatório da ONU Meio Ambiente sobre a lacuna das emissões, intitulada Emissions Gap Report.
De acordo com o estudo, mesmo se fossem cumpridos todos os compromissos assumidos, isso representaria apenas um terço do que é necessário alcançar até 2030 para que os piores impactos das mudanças climáticas sejam evitados.
O fato de os 195 governos que subscreveram o pacto terem, em geral, proposto medidas ainda insuficientes para evitar o aquecimento do planeta nos termos de Paris indica que ainda é um desafio a internalização da problemática das mudanças climáticas como base para as decisões governamentais.
Isso implicaria, segundo os participantes do seminário, orientar o setor de infraestrutura, agropecuário e outros a partir de tal premissa.
Para apoiar os países no cumprimento de seus compromissos de adaptação e mitigação e promover mais transparência, a organização WRI tem testado e avaliado a efetividade de medidas de governança com uma ferramenta desenvolvida pela Open Climate Network (OCN).
"Nossa preocupação ao trazer o tema da governança climática é ir além da mensuração do impacto do efeito estufa", explica Juliana Speranza, que cita a necessidade de avaliar também os processos de implementação das políticas relacionadas às mudanças climáticas de forma geral.
Na aplicação da ferramenta no Brasil, a organização analisou a governança da Contribuição Nacional Determinada (iNDC, na sigla em inglês) ao Acordo de Paris, instrumento de ratificação das medidas que o país pretende desenvolver para colaborar na busca das metas pretendidas pelo conjunto dos signatários. Foram constatados, então, alguns problemas, como a ausência do sistema de monitoramento e avaliação dos resultados da política climática; a fragmentação das políticas em diversos grupos temáticos e a garantia de montante "marginal" de recursos para os instrumentos como financiamento climático, como o Fundo Clima e o Programa de Crédito para Agricultura de Baixo Carbono.
Representantes do governo federal reconheceram, no seminário, que há um arranjo institucional, mas que há riscos de desarticulação, dificuldade de transformar a agenda do clima em uma agenda de desenvolvimento econômico, necessidade de integração das agendas do clima e de infraestrutura, que o atraso na tomada de decisão pode aumentar os custos da transição para uma economia de baixa emissão de carbono e questionável transparência na elaboração dos NDCs A avaliação foi apresentada pela subchefe adjunta de Análise e Acompanhamento de Políticas Governamentais da Casa Civil, Fabiana Martins.
Fabiana defendeu maior visibilidade e prioridade para a política de clima. Como possibilidades para isso e para o desenvolvimento de uma governança, ela citou a solicitação brasileira de adesão à Organização para a Cooperação e Desenvolvimento Económico (OCDE), o que inclui atender recomendações e diretrizes que sinalizam boas práticas internacionais. De acordo com Fabiana, um terço das recomendações trata de questões ambientais.
Além disso, está em curso a revisão da política de governança pública. Na proposta, constam tarefas como o planejamento do desenvolvimento nacional equilibrado, que tem como diretrizes o respeito aos acordos e compromissos internacionais ratificados pelo Brasil, como o Acordo de Paris e os Objetivos de Desenvolvimento Sustentável (ODS); a adoção de mecanismos de participação social e maior transparência das ações governamentais. A política deve ser encaminhada ao Congresso nas próximas semanas.